Os Primeiros Discípulos
No dia seguinte João estava outra vez ali, com dois dos seus discípulos 1.35
1:35-42 Texto da nossa segunda lição do trimestre.
Esta seção nos fornece uma explicação de como Jesus obteve seus primeiros
discípulos; e por meio dela aprendemos que os discípulos originais foram
selecionados dentre o círculo dos discípulos de João Batista. Nos evangelhos
sinópticos (ver Mc 1:16-20 e Mt 4:18-22), somos informados acerca de dois
irmãos que a certo instante foram chamados à beira do mar da Galiléia, quando
se ocupavam de seus misteres da pesca, a fim de que seguissem ao Senhor Jesus,
apelo esse a que obedeceram imediatamente. Essa obediência sem discussões, mui
provavelmente, não foi motivada por aquele primeiro e breve contato com Jesus,
que antes ser-lhes-ia um completo estranho; pois é muito provável que esta
narrativa do evangelho de João seja um incidente que antecede à narrativa dada
pelos evangelhos sinópticos; e isso sem dúvida evidencia o fato de que aqueles
primeiros discípulos já tinham algum conhecimento pessoal com Jesus, e isso por
meio de João Batista, que teria servido de intermediário. A tradição utilizada
por Marcos indica o fato de que os quatro primeiros discípulos, convocados para
o discipulado de Jesus, foram os quatro pescadores de nome André (o primeiro de
todos os discípulos), Pedro, que era seu irmão, e, em seguida, Tiago e João,
estes últimos filhos de Zebedeu. O vs. 35 deste capítulo menciona dois
discípulos. O vs. 40 deste mesmo capítulo dá o nome de um deles—André—, e, em
seguida revela-nos que ele saiu à procura de seu irmão, Pedro; e isso significa
que o outro discípulo do vs. 35. cujo nome não nos é fornecido, não era Pedro.
O capítulo deixa sem identificação esse discípulo cujo nome não é dado, mas,
confrontando a narrativa joanina com a dos evangelhos sinópticos, podemos
concluir que esse discípulo era João, o qual, subsequentemente, e a exemplo do
que já fizera André, saiu à procura de seu irmão, Tiago. O mais provável, por
conseguinte, é que os dois discípulos originais tivessem sido André e João, os
quais, sem tardança trouxeram a Jesus os seus respectivos irmãos, Pedro e
Tiago. Esses quatro, pois, formaram o núcleo original de discípulos, tendo
sido, anteriormente, seguidores de João Batista.
É de estranhar que,
apesar de Tiago e João desempenharem tão importante papel, segundo a narrativa
dos evangelhos sinópticos, —jamais sejam mencionados neste quarto
evangelho senão já no trecho de João 21:2 (de forma definida), e que jamais se
leia qualquer alusão a Salomé, mãe de ambos. Alguns estudiosos têm sugerido que
a proeminência que lhes é conferida nos evangelhos sinópticos foi abafada neste
quarto evangelho em face do fato de João ter sido o seu autor, o qual teria
agido dessa maneira por modéstia. Mas outros sugerem que isso foi feito
propositalmente pelo autor deste quarto evangelho, que na realidade não teria
sido o apóstolo João, como artifício sutil, para sugerir que João foi o seu
autor.
A comparação desta narrativa
sobre a chamada dos discípulos originais de Jesus com a tradição dos evangelhos
sinópticos é suficiente para convencer-nos, ainda mais, que os sinópticos não
figuraram entre as fontes informativas utilizadas pelo autor do evangelho de
João, e que, quando aparecem materiais de natureza similar, isso patenteia o
fato de que tanto os evangelhos sinópticos como o evangelho de João se
fundamentaram em fontes informativas similares, embora distintas. Menos de dez
por cento do material do evangelho de João aparece nos evangelhos sinópticos, e
isso serve de prova do fato de que João não lançou mão destes últimos,
porquanto é impossível pensarmos que, se ele tivesse contado com os mesmos como
fontes informativas, não haveria se utilizado deles em maior escala. Além
disso, o autor do quarto evangelho expõe a vida e o ministério de Jesus de
maneira tão diferente do que fazem os evangelhos sinópticos, em tantas questões
diversas.
Diversas indicações de tempo são
fornecidas neste primeiro capítulo. Os vss. 29-34 descrevem acontecimentos
ocorridos no dia seguinte ao do anúncio feito em Betânia. Os vss. 35-42
descrevem o dia seguinte, ou seja, o terceiro dia (segundo o cômputo judaico)
após o anúncio feito em Betânia, acerca do caráter messiânico de Jesus (ver o
vs. 29). E os vss. 43-51 cobrem os acontecimentos de um quarto dia após aquele.
«A convocação dos
primeiros discípulos de Jesus, vss. 35-52. Os humildes começos de poderosos
resultados. O berço da igreja cristã. Essa chamada na Judéia, às margens do rio
Jordão, foi meramente uma oportunidade preliminar de familiaridade, que João
supriu à base de sua experiência pessoal, ao passo que a chamada final, ao
discipulado permanente, conforme é narrada pelos evangelhos sinópticos, teve
lugar em data posterior, na Galiléia». (Philip Schaff, no Lange's Commentary).
1:36 e, olhando para Jesus, que passava, disse:
Eis o Cordeiro de Deus!
Este versículo é uma
repetição do vs. 29 VEJA AQUI. Os comentadores supõem que João
Batista, e Jesus, após a declaração do primeiro acerca do caráter messiânico de
Jesus, chegaram a uma espécie de acordo quanto à orientação que imprimiriam aos
seus ministérios complementares, embora distintos. E asseveram que mui
provavelmente esse acordo incluiria a questão da transferência de discípulos
de João para Jesus, de tal modo que o ministério messiânico em Israel pudesse ter o seu começo. «Eis o
Cordeiro de Deus. Essa breve repetição daquela maravilhosa proclamação, em
termos idênticos e sem qualquer palavra adicional, teria por intuito servir de
gentil impulso para que os discípulos seguissem a Cristo fixando a luz sob a
qual deveria considerá-lo. E isso surtiu os efeitos desejados, conforme
passamos a ouvir (nos versículos seguintes)». (Brown, in loc.). «...a
repetição da declaração serve, neste caso, de sinal para os discípulos passarem
a seguir a Jesus». (Alford, in loc.).
1:37 Aqueles dois discípulos ouviram-no dizer
isto, e seguiram a Jesus
1:38 Voltando-se Jesus e vendo que o seguiam,
perguntou-lhes: que buscais? Disseram-lhe eles: Rabi (que, traduzido, quer
dizer Mestre), onde pousas?
«...os
dois...seguiram a Jesus...». Esse seguir ao Senhor Jesus
provavelmente foi feito pelos discípulos em profunda reverência e na
expectativa de grandes coisas. O pensamento do discipulado estava em suas
mentes, mas a chamada real (em senso um tanto formal) teve lugar mais tarde, na
Galiléia; e é justamente essa chamada final que é registrada pelos evangelhos
sinópticos. Por conseguinte, este seguir a Jesus até onde ele assistia não
equivaleu ao «deixá-lo simplesmente a um seguir mecânico após Cristo,
conforme Alford sugeriu.
«...seguiram...» Bengel observa sobre
esta informação: «Aqui encontramos a origem da igreja cristã». E Adam Clarke (in
loc.) observa: «E eles compreenderam perfeitamente o que tencionava o seu
mestre; e, em consequência disso, puseram-se a seguir a Jesus. Felizes são
aqueles que, ao ouvirem sobre a salvação que há em Cristo, imediatamente se
apegam ao seu autor!»
«...Que buscais?...». Jesus abriu o caminho
para se tornarem conhecidos, porque, mui provavelmente, seguiam-no de forma um
tanto tímida e nervosa. Essas são as primeiras palavras a brotar dos lábios de
Jesus, de acordo com o evangelho de João, e tinham por intenção facilitar a
amizade e o entabulamento de relações que se seguiu por mais três anos, amizade
essa que se foi aprofundando em todos os aspectos, e que, apesar de ter
recebido o golpe cruel da crucificação do Mestre, no entanto floresceu
novamente, embora em plano muito mais elevado, quando Jesus, já conquistador da
morte, voltou a eles.
«...Rabi...onde
assistes?...». A réplica dada pelos discípulos saiu nervosa, porquanto tinham
consciência de estarem diante de uma augusta figura, um personagem
profético, destinado a cumprir um gigantesco ministério, embora não pudessem,
por enquanto, nem ao menos imaginar a sua magnitude. Não obstante, não tinham
passado a seguir a Jesus na ignorância completa, pois João proferira
elevadíssimas palavras acerca dele, e a sua missão messiânica já fora anunciada
por ele. Por essas razões é que escolheram o vocábulo mais elevado que puderam
encontrar—«Rabi»—que nos é esclarecido pelo termo grego aqui traduzido por
«Mestre». No entanto, a tradução fica muito aquém do que estava implicado no
termo «rabi». Sabemos que não fazia muito tempo que esse vocábulo tinha entrado
em uso, provavelmente tendo sido originado quando das rivalidades entre as
escolas de Hilel e de Shamai, porquanto os seguidores de um e de
outro ansiavam por exaltar os seus respectivos líderes, em contraste com outros
líderes; e assim em certo sentido, tais seguidores justificavam as
características e distintivas crenças de suas seitas, posto que, mediante o
emprego de tal título, os seus líderes seriam vistos como ocupantes de
exaltados ofícios.
Hilel (30 A.C.) era
reverenciado por sua profunda erudição e por sua
santidade inspiradora, misturada com o amor que demonstrava possuir por
seus semelhantes e com o seu espírito de humildade. Muitas lendas se
desenvolveram em torno de sua pessoa, conforme sempre acontece no caso das
vidas de indivíduos notoriamente grandes. Uma dessas histórias diz-nos que uma
delegação de gentios lhe foi enviada, para que ele desse uma concisa declaração
da essência do judaísmo, que pudesse proferir enquanto estivesse equilibrado
apenas numa das pernas. A sua resposta foi: «O que te é odioso, não o faças aos
teus semelhantes: Nisso consiste toda a lei; o resto é mero comentário». (Shab.
31a).
O originador da
escola teológica rival do judaísmo foi Shamai, homem igual e
extraordinariamente reverenciado por motivo de seu conhecimento e piedade.
Ordinariamente, a escola de Hilel era paciente e mais liberal em sua
interpretação da lei, ao passo que a escola de Shamai era inflexivelmente
severa. No primeiro século da era cristã floresciam essas duas escolas, e
faziam constante oposição uma à outra. Mas as opiniões de Hilel gradualmente
foram obtendo aceitação popular.
Foi à base desse
contexto que se originou o costume de dirigir-se alguém a outrem pelo título de rabi
(já esclarecido para facilitar o Pr Antonio Carlos, dicionarista da
Continental.). O termo significa Minha grandeza, «Minha majestade»
ou «Meu Honroso Senhor». Deriva-se da raiz hebraica que significa grande, e
passou a ser comumente usado pelos judeus, ao se dirigirem aos seus
professores. E gradualmente o seu sentido, em muitos casos, passou a ser mero
sinônimo de «mestre», sem indicar, necessariamente, qualquer grande atribuição
de honra a um indivíduo qualquer.
Também foi nesse
costume que teve início a prática de atribuir elevados títulos aos
eclesiásticos, prática essa que foi severamente condenada pelo Senhor Jesus
conforme lemos em Mt 23:7-12. Essa condenação, por si mesma, serve para mostrar
que tal apelativo não significa simplesmente mestre, porquanto chamar
alguém de mestre certamente não é demonstração de que está sendo exaltado; mas
o que Jesus condenava era justamente o elemento de orgulho, que transparecia no uso de
tal termo. Todavia, a despeitadas claríssimas reprimendas de Jesus contra essa
prática, ela permanece muito popular na igreja cristã, apenas com o reparo que
tal pronome de tratamento foi substituído por títulos como «padre»,
«reverendo», «doutor», e outros pronomes de tratamento. Não obstante, esse
vocábulo pode ser corretamente usado com respeito à pessoa de Cristo, e podemos
reter a sua mais ampla significação, porquanto foi empregada por aqueles
discípulos originais do «Mestre» para expressarem a sua elevada estima e
consideração, embora, por enquanto, o conhecimento que tinham dele ainda não
fosse muito grande.
1:39 Respondeu-lhes: Vinde, e vereis. Foram,
pois, e viram onde pousava; e passaram o dia com ele; era cerca da hora décima.
«Vinde e vede...». Não teria sido de
conformidade com os costumes orientais se os discípulos se tivessem convidado a
si mesmos para visitar a casa onde Jesus morava, sem algum convite prévio, e
certamente isso teria demonstrado grande falta de educação, especialmente no
caso de quase totais estranhos, conforme vemos aqui. Assim sendo, devemos compreender
a inquirição dos discípulos meramente como exibição de interesse em descobrir
onde Jesus morava, a fim de que, em data posterior, pudessem estabelecer alguma
forma de contato e relação com ele. Mas Jesus facilitou-lhes as coisas,
tornando mais difícil algum embaraço, ao fazer-lhes imediatamente o convite de
irem visitá-lo. Nas palavras vinde e vede, alguns estudiosos veem uma
alusão à fórmula rabínica que era proferida, como desafio, a futuros discípulos
e aprendizes, para que vissem a validade da doutrina e a correção da vida que
advogavam em seus ensinamentos. Essa fórmula requeria que cada um se
convencesse pessoalmente, mediante a observação e a prática, da validade dos
ensinamentos oferecidos. Contudo, é nos impossível saber se Jesus tinha em vista
qualquer coisa tão profunda como essa, com palavras tão simples; mas, pelo
menos, o resultado final certamente esteve de conformidade com tal desafio.
Isso foi o começo da convicção deles, e, realmente, o começo da convicção de
muitos milhões de pessoas, acerca da validade das palavras e ensinamentos de
Jesus, bem como do valor da vida que resulta da obediência a essas palavras.
Muitos pregadores têm
intitulado suas mensagens de «Vinde e vede», passando a anunciar uma
apologética do cristianismo, que tem suas raízes na convicção pessoal sobre a
veracidade da mensagem, mediante a prática dos preceitos cristãos. Ao assim
fazerem, talvez muito inconscientemente, tais pregadores têm repetido o desafio
lançado pelos antigos rabinos, para que os possíveis discípulos pusessem à
prova a verdade religiosa mediante o exame e a prática pessoais. «A experiência
pessoal é o melhor teste para comprovação da veracidade do cristianismo,
o qual, tal como o sol no firmamento, só pode ser visto em sua própria luz.
Acredito que foi Pascal que disse que as coisas humanas precisam ser conhecidas
para que sejam amadas, mas que as coisas divinas devem ser primeiramente
amadas, antes de poderem ser conhecidas». (Philip Schaff, no Lange’s
Commentary, in loc.).
«...ficaram com ele
aquele dia...». Os comentadores não concordam quanto à ocasião em foco, nesta
expressão, porquanto alguns acreditam que o evangelho de João segue o cômputo
romano de contar o tempo (conforme nós também fazemos, de meia-noite à
meia-noite), ao invés do cômputo judaico, que ia de
pôr-do-sol ao pôr-do-sol. Se foi seguido o método judaico de computar o tempo,
então seria cerca das quatro horas da tarde. Ellicott diz (in loc.):
«Seria, conforme diríamos, quatro horas da tarde, porquanto não existem razões
suficientes para crermos que o método babilônico de contar as horas, comum
tanto em Éfeso como em Jerusalém, não foi usado neste evangelho». A suposição,
por detrás dessas palavras de Ellicott, é que esse tenha sido o evangelho
efésio (escrito em Éfeso, tendo como fontes informativas a comunidade
cristã ali existente. Bruce (in loc.) salienta que se por um lado os
romanos calculavam o seu dia civil de meia-noite à meia-noite ( o dia civil,
mediante o qual eram datados os contratos e os empréstimos), por outro lado, o
cômputo romano ordinário das horas do dia, segundo o uso popular, está em foco
aqui, o qual era contado do nascer do sol ao pôr-do-sol. Isso parece ser
consubstanciado por diversos descobrimentos de relógios-de-sol romanos, nos
quais o meio-dia aparece assinalado como a hora sexta.
Os argumentos que
favorecem o método judaico de calcular a passagem das horas, são os seguintes:
1. Os gregos da Ásia Menor, para quem João teria escrito, usavam o cômputo babilônico,
também tomado por empréstimo pelos judeus (do pôr-do-sol ao pôr-do-sol). 2. Os
romanos também se utilizavam desse método mui comumente, juntamente com o
cálculo do dia civil, conforme foi explicado mais acima. 3. No trecho de
João 4:6, a sexta hora mui mais provavelmente significa o meio-dia do que as
seis horas da manhã ou as seis horas da tarde. Em João 4:52, a sétima hora mais
provavelmente equivale à primeira hora depois do meio-dia. A passagem de João
11:9 subentende o cômputo babilônico. O trecho de João 19:14, que fala sobre a
sexta hora, não pode indicar as seis horas da manhã (embora essa referência
talvez não tenha por intenção ser exata em sua designação do horário).
E verdade que os
outros evangelhos lançam mão do cômputo judaico de contar as horas, mas
isso não prova, necessariamente, que assim também tenha ocorrido neste
evangelho de João. Vincent (in loc.) demonstra, com citações de escritos de
Aélio Aristides, sofista grego do século II D.C. (dos Discursos Sagrados),
bem como dos escritos de Lívio, o historiador romano (IX:37), que o método
«judaico» (na realidade, originado na Babilônia) era de uso comum no mundo
greco-romano. Outro tanto foi demonstrado por Aristófanes («Ecclesizusai»,
648) e por Horácio (lib. 1, VII.69). Embora alguns bons eruditos discordem
disso, parece mais acertado aceitar essa multiplicidade de testemunho,
afirmando que este quarto evangelho, tal como os outros também, seguiu o
cômputo «judaico», e que essa designação, aqui, tem por intuito indicar as
quatro horas da tarde. Nenhuma objeção
sólida contra isso pode ser levantada à base da expressão que lemos no
próprio versículo—«...e ficaram com ele aquele dia...»—porquanto isso não
significa, necessariamente, um dia inteiro, mas meramente que ali ficaram pelo
resto do dia, das quatro horas da tarde em diante.
1:40:
André, irmão de Simão Pedro, era um dos dois que ouviram João falar, e que
seguiram a Jesus.
«Era André...». Portanto, André
foi o primeiro de todos os discípulos de Jesus, e não é mesmo impossível que
esta história, pelo menos quanto ao seu esboço e conteúdo gerais, acerca do
contato original com Jesus e do começo de seu movimento religioso, tenha tido
André como a principal fonte informativa. Essa tradição foi, mui
provavelmente, preservada pela comunidade da igreja cristã em Éfeso, e dali é
que passou para o evangelho de João. Por qual motivo a comunidade romana não a
incluía, pelo que também não figura no evangelho de Marcos, e,
subsequentemente, nos demais evangelhos sinópticos, é algo que não sabemos
dizer.
André foi um dos doze
apóstolos; o seu nome significa varonil. Era filho de Jonas ou «João», e
procedia de Betsaida, na Galiléia. (Ver Jo 1:44). Entretanto, mais tarde fora
viver com Pedro, em Cafarnaum (ver Mc 1:29), que pode ter sido a cidade onde
morava a sogra de Pedro, e para onde este último pode ter-se mudado após o seu
casamento. Em Cafarnaum, os dois irmãos se tinham tornado ativos pescadores.
(Ver Mt 4:18). André se tornara discípulo de João Batista (ver Jo 1:35-40), e
foi partindo desse contato que chegou a conhecer ao Senhor Jesus.
Posteriormente, André foi convocado para o completo discipulado (ver Mt
4:18-20; Mc 1:16-18). André geralmente é relembrado por sua fé prática,
porquanto saiu em busca de seu irmão e o trouxe a Cristo. A tradição
(considerada provável) assevera que ele, afinal, teve de morrer como mártir, na
Acaia. Os evangelhos sinópticos pouco falam a respeito dele, e o seu grande
serviço consistiu em levar Pedro a Cristo, acerca do que observou William
Temple: «Talvez seja tão grande serviço, prestado à Igreja, como qualquer outro
jamais realizou». (Extraído de Readings in St. John ’s Gospel, pág. 29).
André foi o primeiro missionário nacional (Jo 1:42), e também o primeiro
missionário ao estrangeiro (Jo 12:21,22).
«André, que paira nos
limiares do círculo mais íntimo dos discípulos, ocasionalmente dentro desse
círculo, embora não usualmente, não recebe proeminência na narrativa dos
evangelhos. Porém, quando podemos obter alguma visão a respeito dele, ele está
sempre fazendo a mesma coisa, isto é, conduzindo outros a Cristo; e, por meio
desses outros, em segunda mão, efetuando poderosas coisas para Cristo, pois,
não fora ele, nada teriam feito. Pedro era o amigo mais íntimo de nosso Senhor,
e foi André que deu a Cristo esse presente especial. Também foi a André que o
jovem trouxe, um tanto envergonhado, o seu pequenino pacote de alimentos; e foi
André, igualmente, também um tanto envergonhado, que trouxe o jovem e a sua
inadequada oferta a Cristo...Foi um obscuro frade dominicano quem
primeiro levou João Knox aos pés de Cristo...Assim também, pessoas simples, sem
quaisquer dotes particulares, podem fazer coisas maravilhosas para Cristo, por
intermédio daqueles a quem influenciam». (Arthur John Gossip, in loc.).
Disciplina e Diligencia
1. O discipulado tem
sua origem no fato de que nossos destinos estão vinculados ao de Cristo;
portanto, devemos seguir o seu caminho, moral e espiritualmente falando, para
que nossas respectivas missões e potencialidades sejam cumpridas. (Ver Rm 8:29
e Mt 28:18-20).
2. O discipulado requer a
renúncia no presente (ver Mc 8:36 e ss.).
3. O discipulado requer
completa dedicação (ver Rm 12:1-2).
4. O discipulado requer o
uso dos meios de desenvolvimento espiritual, como a oração (ver Ef 6:18); a
meditação que nos capacita a ver a iluminação (ver Ef 1:18); a santificação
(ver I Ts 4:3); a prática da lei do amor, que é a comprovação da
espiritualidade (ver a I Jo 4:7); a dedicação da mente aos princípios
espirituais, através do estudo dos livros sagrados e de outra literatura de valor
(ver I Ts 4:13); e o emprego dos dons espirituais (ver I Co 12 e Ef 4:8 e ss.).
1:41 Ele achou primeiro o seu irmão Simão, e
disse-lhe: Havemos achado o Messias
(que
traduzido, quer dizer Cristo).
1:42 E o levou a Jesus, fixando nele o olhar,
disse: Tu és Simão, filho de João; tu será chamado Cefas
(que quer dizer Pedro)
«...achou primeiro ao seu próprio
irmão...» (Quanto à exposição e às implicações desta declaração, ver as notas
anteriores, no vs. 40). André é aqui descrito como irmão de Pedro, sem
dúvida por causa da distinção mais aviltada de Pedro na narrativa evangélica;
mas não parece haver margens para dúvidas de que André exerceu influência tanto
sobre Pedro como sobre João, embora leiamos que ele procurou a seu irmão e a
ele proclamou confiantemente o caráter messiânico de Jesus. «Ele (André)
aparece novamente como mediador e pioneiro, em João 12:22». (Lange, in loc.). Com base no próprio texto
sagrado, não podemos determinar quando ocorreu esse levar de Pedro, por parte
de André, à presença de Jesus; provavelmente teria acontecido no mesmo dia em
que Pedro conheceu a Jesus, embora o mais provável seja que o tenha feito no
dia seguinte. Seja como for, notícias tão importantes como aquelas, para os
ouvidos judeus, não poderiam ter ficado adormecidas por longo tempo. Alguns
intérpretes (como Meyer) supõem que João também agiu da mesma maneira que
André, isto é, que não se demorou em trazer a Jesus Cristo o seu próprio irmão,
Tiago, embora sobre isso a narrativa dos evangelhos faça o mais total silêncio.
Há uma variante textual aqui, em
torno do vocábulo «primeiro». Essa variante é entre protos (nos
mss Aleph, L e W, bem como na maioria dos manuscritos gregos posteriores), o
que provavelmente indicaria que ele, antes de João, trouxe o seu próprio irmão
a Jesus, ficando subentendido que João mais tarde fez outro tanto, trazendo a
Jesus o seu irmão, Tiago. Não obstante, o texto mais bem comprovado, é «proton»
(nos mss P(66), P(75), BA, Theta, Fam 1, Fam 13 e na maioria das versões
latinas). Algumas antigas versões têm traduzido essa palavra como «pela manhã»
(assim dizem a versão latina b e o Si(s). Ou talvez isso signifique que André
tenha procurado a seu irmão antes de qualquer outra coisa, ficando subentendida
a prioridade dessa ação. Mui provavelmente esse é o sentido aqui tencionado.
Temos, pois, aqui, o «precedente evangélico». Este ensina-nos que, antes de qualquer outra coisa, é
nossa responsabilidade conduzir os homens a Cristo, não de maneira superficial
ou «mágica», ensinando-lhes orações e encantando os simplistas, como se essas
coisas tivessem o mágico efeito de converter aqueles que os proferem, mas de
uma maneira tal que lhes mostre que Cristo é o alvo mesmo de toda a existência
humana, e que ele é o caminho de volta para o Pai, e que por intermédio de seu
Espírito seremos transformados segundo a imagem de Cristo. E assim
daremos aos homens uma melhor compreensão sobre as razões e sobre o destino da
existência humana.
«...Messias... que quer dizer
Cristo...». Outra tradução, tal como já se vira no vs. 38, o que novamente
demonstra que este quarto evangelho foi escrito para alguma comunidade não
judaica, provavelmente a igreja cristã de Éfeso.
«...tu serás chamado Cefas...». Outra tradução ainda
aparece aqui, a terceira deste capítulo. (Ver as notas referentes ao parágrafo
anterior, quanto ao sentido disso. Outras instâncias dessa prática do autor
existem, o que mostra que ele escreveu para uma comunidade não-judaica, ver os trechos
de João 4:25; 5:2; 9:7; 11:16; 19:13,17 e 20:16). Cefas também é um nome
aramaico, apelativo esse que também foi usado por Paulo e Pedro, e que aparece
nas epístolas de 1 Coríntios e de Gálatas por nada menos de oito vezes, embora
em mais nenhuma outra porção do N.T., sem contar com a deste versículo. «Pedro»
significa homem de rocha, e aparece na lista dos doze, no evangelho de
Marcos (3:16).
«Além desses também havia Pedro, um dos
personagens mais vividamente retratados na literatura; intensamente
humano em todas as ocasiões, e digno de afeição até mesmo em seus piores
equívocos—e esses foram muitos—tinha como ‘sinal especial, como homem’, a sua
estranha inconstância. Era tão repentino e surpreendente, nas ondas de seus
sentimentos interiores, como o mar da Galiléia, onde, sem qualquer aviso, os
ventos sopram das colinas circundantes e, em um momento, agitam furiosamente o
lago; não obstante, quase que no momento seguinte, pode ficar novamente calmo
como a morte. Ora, Cristo olhou para ele e disse com toda a confiança: ‘Serás
um homem forte como uma rocha, sobre o qual poderei edificar a minha igreja’. À
primeira vista não parecia assim, e muito demorou para que ele nisso se
tornasse. E houve nesse ínterim dolorosos desvios. Mas, finalmente, assim
aconteceu. As possibilidades que somente Cristo percebeu no homem estavam
presentes, e se transformaram em um fato. E Cristo prometeu que podemos
desenvolver-nos segundo a sua própria imagem. Tudo ainda nos parece muito
distante; e talvez nos pareça tão impossível como sempre. Não obstante, no
dizer de Paulo, nenhum dos que confiam em Cristo jamais será desapontado. (Ver
Rm 10:11, tradução de Moffatt). Se Cristo assim declarou, certamente pode
realizá-lo, e assim fará. E assim, um dia, tudo será uma realidade, e o sonho
se materializará». (Arthur John Gossip, in loc.).
Há certa variante textual em torno do
nome do pai de Pedro. Alguns manuscritos (a maioria dos posteriores,
incluindo os mss AB(3) EFGHKMSUVX, Gamma, Delta e Fam Pi) dizem Jonas.
Theta assim também diz, embora com variação na forma escrita. Todavia, os manuscritos
mais antigos, P(66), P(75), Aleph, BL e a maioria das antigas versões latinas,
dizem João. Não parece haver dúvidas que esse seja o texto correto neste
evangelho de João. Porém, o texto correto em Mt 16:17, é Jonas. O
apócrifo evangelho segundo aos Hebreus diz «João». A passagem de João 21:15,17,
uma vez mais, fornece-nos o nome de «João» como o pai de Pedro. Diversas
tentativas têm sido feitas para explicar que «João» realmente surgiu como
modificação de «Jonas». Alguns eruditos acreditam que «João» surgiu, como nome
do progenitor de Pedro, tanto neste evangelho de João como em outras tradições,
por causa da helenizaçâo do apelativo hebraico «Jonas», ou então por
simples erro de identificação dos dois nomes, por serem tão semelhantes entre
si.
Bibliografia R. N. Champlin