O cristão deve ter
convicção na eficácia da oração
Texto Áureo
"Com toda oração e
súplica, orando em todo tempo no Espírito e para isto vigiando com toda
perseverança e súplica por todos os santos". Ef 6.18
Verdade Aplicada
A vida espiritual do
cristão acaba quando permite que seja afetada pela carência da oração.
Objetivos da Lição
Conhecer os poderosos
efeitos da oração feita por um justo;
Lembrar que os cristãos
devem cuidar da saúde espiritual uns dos outros;
Saber que o pecado na
igreja deve produzir disciplina, intercessão e restauração.
Texto de Referência
Tg 5.13 Está alguém
entre vós sofrendo? Faça oração. Está alguém alegre? Cante louvores;
Tg 5.14 Está alguém
entre vós doente ? Chame os presbíteros da igreja, e estes façam oração sobre ele,
ungindo-o com óleo, em nome do Senhor;
Tg 5.15 E a oração da
fé salvará o enfermo, e o Senhor o levantará; e, se houver cometido pecados,
ser-lhe-ão perdoados;
Tg 5.16 Confessai,
pois, os vossos pecados uns aos outros e orai uns pelos outros, para serdes
curados. Muito pode, por sua eficácia, a súplica do justo;
Tg 5.17 Elias era homem
semelhante a nós, sujeito aos mesmos sentimentos, e orou, com instância, para
que não chovesse sobre a terra, e, por três anos e seis meses, não choveu.
A oração e a cura
(5.13-18)
Tiago, à semelhança de
tantos outros escritores de cartas do Novo Testamento, conclui sua
homilia(Pregação em estilo familiar e quase coloquial sobre o Evangelho) com um
incentivo à oração. A
oração é claramente o assunto deste parágrafo, sendo mencionada em cada
versículo. Tiago a recomenda para o indivíduo crente, nas diferentes
situações que este possa enfrentar (vv. 13-14), e também para a comunidade (v.
16a). E ele incentiva tal oração, ao sublinhar os poderosos efeitos de uma oração procedente de um
coração justo (vv. 16b-18). Pode ser observada alguma relação com o
versículo 12, através do tema comum do falar com referência a Deus (discursos
maus, v. 12; e bons, vv. 13-18), mas Tiago nada faz para sugerir tal
associação. É mais plausível pensar que Tiago queira recomendar a oração como
uma grande fonte de forças para a aflição que os leitores estão experimentando
(veja o uso de kakopatheia tanto no versículo 10 como no 13). Entretanto, em
essência o parágrafo é uma divisão independente.
13. "Orar em todo
tempo" é a ordem de Paulo (Ef 6.18; 1 Ts 5.17). De forma semelhante, Tiago
exorta os crentes a orarem em qualquer situação em que se encontrem. Eles devem
orar se estiverem sofrendo. Kakopatheia, a mesma palavra usada por Tiago no
versículo 10 com referência aos profetas, é um termo geral que denota a
experiência de todo tipo de aflição e provação. Paulo usou a forma verbal desta palavra, ao descrever sua
prisão e exortar Timóteo a estar pronto para passar pelo mesmo tipo de
sofrimento (2 Tm 2.9; 4.5). A oração a ser oferecida pelos crentes em
tais circunstâncias não é necessariamente em favor do livramento das provações,
mas por força para resistir a elas em fidelidade. O crente também deve orar
quando está alegre. Euthymeõ não se refere a circunstâncias externas, mas à felicidade e alegria de
coração que se pode ter, tanto em tempos maus quanto bons. Paulo
incentivou seus companheiros de viagem a terem este sentimento de bem-estar,
mesmo quando o navio deles corria perigo iminente de destruição (At 27.22,25) Quando nosso coração está
confortado, é muito fácil esquecermos que este contentamento, em última
análise, vem de Deus. Talvez por isso, mais do que quando estamos
sofrendo, devamos ser lembrados, em tempos de felicidade, de nossa alegre
obrigação de admitirmos o
controle supremo de Deus sobre nossa vida. Tiago diz que devemos fazer
isto cantando louvores. A palavra que ele emprega, psaltõ, lembra-nos da
palavra em português, "salmo". Extraída de uma palavra grega aplicada a um tipo de harpa,
ela foi usada na Septuaginta para descrever certos tipos de cânticos,
especialmente os de louvor. Aquele louvor cantado estava intimamente
relacionado com a oração (cf. 1 Co 14.15); na verdade, ele pode ser considerado
uma forma de oração.
14. A terceira circunstância
na qual a oração deve aparecer com proeminência é agora mencionada de modo
específico: a doença.
Entretanto, neste caso, o
crente enfermo não recebe ordens para orar, mas para convocar os presbíteros da
igreja, para que estes façam oração sobre ele. Os presbíteros são
mencionados no livro de Atos, em associação com a igreja de Jerusalém (11.30;
15.2; 21.18) e as igrejas fundadas por Paulo (14.23; 20.17). Embora, em suas
epístolas, Paulo se refira nominalmente aos presbíteros apenas em 1 Timóteo
(5.17) e Tito (1.5), "bispo", mencionado no plural em Filipenses 1.1
e no singular (provavelmente genérico) em 1 Timóteo 3.1, é quase por certo um
título diferente para a mesma função. Tanto Pedro (1 Pe 5.1) quanto Tiago
pressupõem a existência de
presbíteros na igreja, demonstrando que o ofício devia estar amplamente
difundido na primeira igreja. É possível, embora não haja certeza, que o ofício tenha sido extraído
da sinagoga. A partir do papel proeminente dos presbíteros em Atos e da
descrição do ofício nas epístolas pastorais, pode se inferir que os presbíteros
eram aqueles homens espiritualmente maduros, responsáveis pela supervisão
espiritual de cada congregação local. Uma vez que os presbíteros efésios
tinham de "pastorear" seu rebanho (At 20.28), e "pastores" nunca são
mencionados junto com presbíteros, é provável que a função que
conhecemos como a do "pastor" ou "ministro" fosse cumprida
pelos presbíteros. Por isso, é natural que o crente que está sofrendo de alguma
enfermidade deva chamar os presbíteros.
Quando os presbíteros
chegam, eles devem orar sobre (epi) aquele que está doente. No grego bíblico,
apenas aqui proseuchomai (façam oração) é seguido por epi: isto pode indicar
simplesmente posição física, mas pode também subentender que as mãos eram
impostas sobre a pessoa doente (veja Mt 19.13). Esta oração deve ser acompanhada de "unção com
óleo" — provavelmente na mesma hora da oração (considerando o
particípio aoristo como contemporâneo, segundo faz a maioria dos
comentaristas), mas também é possível que seja um ato preliminar à oração.
Esta unção deve ser realizada em nome do Senhor, representando a
autoridade divina com a qual se pratica a unção (veja Atos 3.6,16; 4.7,10). Mas
qual é o propósito desta unção com óleo? No Novo Testamento, a prática é
mencionada somente em mais um caso: Marcos nos diz que os doze "expeliam
muitos demônios e curavam numerosos enfermos, ungindo-os com óleo" (6.13).
Infelizmente, ali não se oferecem explicações da prática maiores do que as de
Tiago. De modo geral, existem duas possibilidades principais para o propósito
da unção.
Primeira,
ela pode ter um propósito prático. O óleo era largamente utilizado como remédio no mundo antigo. Na
parábola de Jesus, ele nos diz que o samaritano que parou para ajudar o homem
que havia sido roubado e espancado "pensou-lhe(Tratamento, sustento,
limpeza, curativo, de crianças ou animais) os ferimentos, aplicando-lhes óleo e
vinho" (Lc 10.34). Outras fontes antigas atestam a utilidade do óleo na
cura de qualquer coisa, desde uma dor de dente até uma paralisia (Galeno, famoso médico do segundo
século recomendava o óleo como "o melhor dos remédios para a
paralisia" Mod. Temp., 2). Então, o que Tiago pode estar dizendo é
que os presbíteros devem se aproximar do leito do doente armados de recursos
espirituais e naturais — com
oração e remédio. Ambos podem ser administrados com a autoridade do
Senhor e os dois podem ser utilizados por ele na cura do doente. A dificuldade
desta linha de pensamento é dupla. Primeiramente, não há evidências de que a
unção com óleo fosse usada para qualquer problema médico — e por que mencionar
apenas um remédio (embora muito usado), se tantas enfermidades diferentes
podiam ser encontradas? Em segundo lugar, por que os presbíteros da igreja
deviam fazer a unção, se o propósito dela era somente medicinal? Seguramente,
outros já teriam feito isto, caso se tratasse de um remédio apropriado para a
doença.
Como um tipo diferente
de propósito prático, outros sugerem que a unção podia ser realizada como expressão exterior e
física de cuidado, uma forma de estimular a fé da pessoa enferma.
Algumas vezes, Jesus usou "acessórios" físicos em suas curas,
aparentemente apenas com este propósito. Mas, quando Jesus agia assim, a ação
física era especificamente apropriada à enfermidade, tal como colocar as mãos
sobre os olhos de um cego (Mc 8.23-26) ou seu dedo nos ouvidos de um surdo (Mc
7.33). Simplesmente não há evidências de que a unção com óleo fosse usada, de
modo geral, com tal propósito.
Assim, é provável que a
unção com óleo tivesse um propósito religioso. Esta segunda explicação
principal da prática pode ser subdividida em dois tipos, de acordo com o fato
de a unção ser vista como detentora de significado sacramental Ou apenas
simbólico. A interpretação sacramental desta prática surgiu cedo na história da
igreja. Com base neste texto, a igreja grega antiga praticava aquilo que
chamava de "euchelaion" (uma combinação das palavras euchê,
"oração", e elaion, "óleo", os dois usados neste texto),
com o propósito de fortalecer o corpo e a alma do enfermo. A igreja do Ocidente
continuou esta prática por muitos séculos, usando também o óleo para unção em
outras ocasiões. Mais
tarde, a igreja romana conferiu ao sacerdote o direito exclusivo de realizar
esta cerimônia e desenvolveu o sacramento da "extrema unção". Este sacramento tem o propósito
de remover qualquer vestígio de pecado e fortalecer a alma da pessoa que está
morrendo (a cura é considerada apenas uma possibilidade). O Concilio de
Trento (XIV, 1) encontrou a "sugestão" deste sacramento em Marcos
6.13 e sua "promulgação" em Tiago 5.14. É claro que este sacramento
desenvolvido tem pouca base no texto de Tiago: ele recomenda a unção com óleo
para qualquer doença e a associa com a cura, e não com a preparação para a morte.
Todavia, o óleo podia ser considerado um elemento com função sacramental, à
medida que atuava como um "veículo do poder divino". Da forma como participar da Ceia
do Senhor transmite ao crente um fortalecimento na graça, assim a unção
pode ser ordenada por Deus como um elemento físico, através do qual ele opera a
graça da cura no crente enfermo. Nossa atitude diante desta posição irá
depender bastante de nossa visão geral acerca de "sacramento". Mas
pode ser questionado se uma prática mencionada apenas uma vez no Novo
Testamento (embora çf. Mc 6.13) pode possuir a importância que esta linha de
pensamento atribui à unção. É melhor, então, pensar na unção com óleo como um
ato simbólico. No Antigo
Testamento, freqüentemente a unção é o símbolo da consagração de pessoas ou
objetos para o uso e serviço de Deus. E embora, nestes textos,
geralmente seja usado chriõ, é provável que Tiago tenha escolhido aleiphõ por
causa do ato físico envolvido (veja, abaixo, Nota Adicional sobre aleiphõ e
chriõ). Ao orarem, os presbíteros
podiam ungir a pessoa doente, a fim de simbolizar que ela estava sendo
"separada" para receber atenção e cuidado especiais de Deus.
Apesar de Calvino, Lutero e outros expositores pensarem que a prática da unção,
ao lado do poder de cura, se limitou à era apostólica, é duvidoso se tal
restrição pode ser mantida. A recomendação de Tiago no sentido de que oficiais
eclesiásticos regulares realizassem a prática parece deixar subentendida sua
validade permanente para a igreja. Por outro lado, o fato de a unção de doentes
ser mencionada apenas aqui, dentre as epístolas do Novo Testamento, e também o
fato de que muitas curas foram realizadas sem unção demonstram que a prática
não é um acompanhamento necessário à oração pela cura. Os presbíteros que oram
pelo doente podem utilizá-la, e Tiago claramente recomenda a prática; mas eles
não precisam fazer isto.
Nota
Adicional: aleiphõ e chrio (5.14)
A Bíblia emprega duas
palavras gregas que significam "ungir": chriõ e aleiphõ. A opção de
Tiago pela última, no versículo 14, pode ajudar nossa interpretação de sua
referência a "ungir com óleo".
Aleiphõ é usada apenas
vinte vezes na Septuaginta. Ezequiel é o único autor a usá-la no sentido de
"caiar" paredes (sete vezes, todas traduções do heb. tüh). A palavra
muitas vezes se refere ao ato de passar óleo na face ou no rosto com propósitos
higiênicos ou estéticos (nove vezes, geralmente com o termo hebraico sük).
Todavia, em quatro ocasiões o verbo tem um significado cerimonial. O sentido
exato de Gênesis 31.13 não é claro, mas em Êxodo 40.15 (duas vezes) e Números
3.3, aleiphõ denota a unção cerimonial dos sacerdotes, por meio da qual eles
eram separados para o serviço de Deus.
Este último sentido é
também o sentido habitual de chriõ na Septuaginta. Na maior parte de suas
setenta e oito ocorrências, ele designa a "consagração" de
sacerdotes, de mobílias do santuário ou do rei de Israel. Apenas três vezes se
refere ao tratamento cosmético. De modo significativo, nenhuma palavra é usada
em relação a propósitos medicinais na Septuaginta.
No Novo Testamento, é
mantido o mesmo quadro geral. Chriõ tem sempre um sentido metafórico,
designando o ato especial de Deus separar a Jesus para seu ministério (Lc 4.18
[ = Is 61.1]; At 4.27; 10.38; Hb 1.9 [ = SI 45.7]) ou a consagração de Paulo ao
ministério dele (2 Co 1.21). Assim como na Septuaginta, aleiphõ aplica-se, na
maior parte dos casos, à unção cosmética ou higiênica (Mt 6.17; Mc 16.1; Lc
7.38,46 [duas vezes]; Jo 11.2; 12.3). Entretanto, é possível que a palavra
tenha algumas implicações simbólicas no relato da unção de Jesus (Jo 11.2;
12.3).
A importância destes
dados para Tiago 5.14 não é totalmente clara. Por um lado, pode ser argumentado
que chriõ é a palavra que, com maior freqüência, tem implicações simbólicas e
que, se Tiago tivesse tal significado em vista, ele provavelmente a teria
escolhido. Todavia, por outro lado, nenhuma palavra é usada nas Escrituras com
um sentido medicinal (deixando de lado, por ora, Mc 6.13 e Tg 5.14). Em Lc
10.34, onde óleo (elaion) tem claramente um uso medicinal, é usado o verbo
epicheõ, "aplicar". Portanto, Tiago provavelmente optou por usar
aleiphõ aqui, porque é a palavra neotestamentária que descreve o ato físico, de
ungir; no Novo Testamento, chriõ nunca se refere à unção física.
Mas, apesar de Tiago
descrever uma ação claramente física, não é necessário eliminar dela todo
significado simbólico. Como já vimos, na Septuaginta, aleiphõ é empregado em
equivalência a chriõ, aplicando-se à consagração de sacerdotes (Ex 40.15; cf.
chriõ em 40.13; Nm 3.3). (Josefo pode também usar aleiphõ com sentido
simbólico, paralelamente a chriõ; compare Antiguidades 6.165 com 6.157.) É melhor, então, considerar a
unção referida por Tiago como um ato físico com significado simbólico. Uma vez
que o simbolismo da "unção" está geralmente associado com a separação
ou consagração de alguém ou alguma coisa para Deus, provavelmente devamos
entender isto como o simbolismo pretendido na ação. Os presbíteros, ao orarem
pela pessoa doente, também a separam para receber atenção especial de Deus.
15. Apesar de a unção
com óleo, devido a seu significado incerto, naturalmente atrair bastante
atenção, devemos nos lembrar de que a principal preocupação de Tiago nestes
versículos é a oração.
Isto é refletido pelo fato
de Tiago atribuir a cura prevista à oração dos presbíteros, não à unção.
A oração é denotada com uma palavra incomum, euche, que conota um desejo ou
petição forte, fervoroso (veja o emprego do verbo euchomai em Atos 26.29;
27.29; Rm 9.3). Mas o que torna a oração eficaz não é o fervor ou a freqüência — é a fé. Fé, em
1.6-8, onde Tiago também discute a eficácia da oração, refere-se a um
compromisso inabalável e sincero com Deus. Uma vez que são os presbíteros que
fazem esta oração, é claro que aqui a referência é à fé que eles têm. Tiago
descreve dois resultados da oração da fé: o enfermo será "salvo" e o
Senhor o levantará. Salvar (sõzõ), no Novo Testamento, geralmente se refere ao
livramento da morte espiritual, e alguns eruditos pensam que, aqui, este também
é o sentido de Tiago. De fato, eles sugerem que todo o trecho dos versículos
14-16a pode ser sobre a restauração à saúde espiritual, em lugar da saúde
física. Mas a linguagem de Tiago é bastante específica para dar margem a esta
interpretação; é claro que ele está pensando, pelo menos basicamente, na cura
física. A palavra sõzõ é certamente apropriada como descrição da restauração da
saúde e neste sentido é usada freqüentemente nos evangelhos. De forma
semelhante, levantará (egeirõ) é usado para descrever o vigor físico renovado
daqueles que foram curados (Mt 9.6; Mc 1.31; At 3.7). Por isso, o quadro é de presbíteros orando
"sobre" o "doente" no leito, e o Senhor intervindo para
"levantá-lo" dali.
A introdução de Tiago
ao tópico do pecado neste ponto é, sem dúvida, ocasionada pela crença comum de
que a doença era causada por pecado. Mas o uso que Tiago faz de e se (kan) torna claro que ele não
acredita que a doença seja necessariamente resultado de pecado e, neste ponto,
é lógico, ele está seguindo o ensino de Jesus (cf. Jo 9.2-3). Por outro lado, o
Novo Testamento mostra com clareza que a doença e a morte podem ser causadas
por pecado (Mc 2.1-12; 1 Co 5.5 (?); 11.27-30), e é a esta eventualidade que
Tiago se refere neste ponto. Isto não deve ser explicado segundo as linhas das
modernas descobertas acerca das relações entre doenças físicas e psicológicas.
O que Tiago associa com a doença é o pecado, não instabilidade emocional ou
desarranjos psicológicos.
Tiago não introduz
nenhuma qualificação para as promessas neste versículo: a oração da fé salvará
o enfermo, e seus pecados ser-lhe-ão perdoados. Será que isto significa que uma
oração por cura, oferecida com fé, será infalivelmente eficaz? Como já vimos,
algumas pessoas sugerem que é assim mesmo, mas limitaram tais curas miraculosas
à era apostólica. Mas nada no texto sugere esta restrição. Uma observação mais
útil é notar que o lembrete específico de Tiago é no sentido de que a oração
deve ser a oração da fé. Esta
fé, apesar de certamente incluir a idéia de confiança na capacidade que Deus
tem de responder, também envolve uma confiança absoluta na perfeição da vontade
de Deus. Assim, uma verdadeira oração de fé sempre inclui um
reconhecimento tácito(Silencioso, calado. Em que não há rumor; Que não se
exprime por palavras; subentendido, implícito) da soberania de Deus em todas as
questões; é a vontade de Deus que deve ser feita. E é claro que, indubitavelmente, a vontade de Deus nem
sempre é de curar aqueles que estão enfermos (cf. 2 Co 12.7-9).
Portanto, a
"fé", condição indispensável para a resposta à nossa oração pedindo
cura — esta fé, sendo dom de Deus — pode estar de fato presente apenas
quando a vontade de Deus é de curar.
16a. Como conseqüência
(oun) da promessa de que Deus responde à oração (vv. 14-15a) e perdoa pecados
(v. 15b), os crentes devem se comprometer a confessar seus pecados uns aos
outros e a orar uns pelos outros. A mútua confissão de pecados, que Tiago
incentiva como uma prática habitual (isto é sugerido pelo tempo presente do
imperativo), é altamente benéfica para a vitalidade espiritual da igreja. Isto foi visto na época do
movimento "metodista", na Inglaterra do século XVIII. A
"regra" sugerida para pequenas reuniões de crentes, que abasteciam
espiritualmente aquele movimento, tinha como princípio o incentivo à mútua
confissão e oração, a partir de Tiago 5.16a.
Que tipos de pecados devem ser confessados? Pode ser que Tiago
esteja pensando apenas naqueles pecados que tenham causado dano a outras
pessoas (cf. Mt 5.25-26). Mas o final da sentença torna provável que estejam em
vista especificamente aqueles pecados que podem ter causado a doença. Para
serdes curados expressa o propósito da confissão mútua e da oração. Muitos
consideram esta "cura" como de natureza espiritual ou, talvez, uma cura
geral, incluindo as esferas física e espiritual. Neste caso, o versículo 16a
deve ser encarado como uma dedução geral extraída da situação específica dos
versos 14-15. Mas é melhor considerar esta sentença como uma exortação final na
discussão da doença física. Isto se deve ao fato de o verbo "curar"
(iaomai) ser consistentemente aplicado a aflições físicas. Seguramente, ele é
usado na Septuaginta para descrever a cura do pecado da infidelidade (cf. Dt
30.3; Is 6.10; 53.5; Jr 3.22), mas, em geral, naqueles contextos este pecado já
fora explicitamente comparado a uma "ferida". No Novo Testamento,
iaomai é usado em aplicação espiritual apenas em citações destes textos do
Antigo Testamento. Portanto, uma vez que o propósito da confissão e oração é a
cura física, é melhor entender a confissão como estando a envolver quaisquer
pecados que possam colocar obstáculo à cura, e as orações como sendo
especificamente em favor da cura das aflições corporais. É digno de nota que,
enquanto no versículo 14 os presbíteros devem orar pela cura, aqui toda a
igreja deve estar envolvida na oração pelo restabelecimento. Segundo Davids,
Tiago "generaliza conscientemente, tornando o argumento de 5.14-15 um
princípio geral de medicina preventiva...". Este versículo demonstra que o
poder para a cura está investido na oração, não no presbítero. E, embora seja
apropriado que aquelas pessoas encarregadas da supervisão espiritual da
comunidade sejam chamadas para interceder pelos seriamente enfermos, Tiago
deixa claro que todos os crentes têm o privilégio e a responsabilidade de orar
pela cura.
Nota Adicional acerca
da Cura
Tiago 5.14-16 é a única
passagem nas epístolas neotestamentárias a tratar diretamente da questão da
cura física. Então, é apropriado que se acrescentem alguns comentários ao texto
e se reflita um pouco mais sobre o assunto da cura. Há vários pontos a se
considerar.
a. A cura física e a
cura espiritual. Como já vimos, algumas pessoas argumentam que o texto não tem
absolutamente nada a ver com a cura física, mas, sim, com a restauração
espiritual. Elas afirmam que astheneõ, no versículo 14, pode significar
"espiritualmente fraco" (1 Co 8.11; 2 Co 13.3), da mesma forma que
kamriõ, usado no versículo 15 (cf. Hb 12.3). E salvará (sõzõ), levantará
(egeifõ) e curados (iaomai) são usados para descrever a restauração à
vitalidade espiritual. Aparecendo num contexto onde os perigos da
letargia(Estado patológico observado em diversas afecções do sistema nervoso
central, como encefalites, tumores, etc., caracterizado por um sono profundo e
duradouro do qual só com dificuldade, e temporariamente, pode o paciente
despertar. Estado de insensibilidade característico do transe mediúnico. Sono
profundo.) e negligência espirituais são bem reais (cf. 5.7-11), uma exortação
para que os presbíteros orem pelos oprimidos e fracos na fé seria inteiramente
apropriada. Apesar de tudo isto ser verdade, a linguagem de Tiago torna
impossível a eliminação da dimensão física. Primeiro, embora astheneõ possa
denotar fraqueza espiritual, este sentido é geralmente esclarecido por um
qualificador (cf. Rm 14.1, "na fé"; 1 Co 8.7,
"consciência") ou pelo contexto. Além disso, no material mais
importante para Tiago, os evangelhos, astheneõ quase sempre se refere à doença.
O mesmo vale para kamriõ. E iaomai, quando não usado numa citação do Antigo
Testamento, no Novo sempre se aplica à cura física. Além disso, é importante o
fato de que, no Novo Testamento, a única outra menção de "ungir com
óleo" apareça numa descrição de cura física (Mc 6.13).
Então, aceito o fato de
que a cura física está em vista, é possível que esteja envolvida a restauração
espiritual? Muitos pensam que este é o caso no versículo 16a; outros acham que
a "salvação", no verso 15, pode ser deliberadamente ampla e incluir
tanto a dimensão física quanto a espiritual. Por isso, mesmo que a oração da fé não traga a cura, ela
pode trazer a salvação do pecado. Mas esta idéia não se encaixa bem no
texto. Em primeiro lugar, a salvação nunca é vista como resultado de oração, no
Novo Testamento. Em
segundo lugar, conferir dois significados diferentes, embora afins, a
"salvar" e "levantar" é um desrespeito a um princípio
cardinal de semântica: nunca dar a uma palavra mais significado do que requer o
contexto; e devemos ser cautelosos em acrescentar uma referência desnecessária
ao livramento espiritual. Vários elementos do texto exigem uma ligação
com a cura física; todas as coisas no texto fazem sentido como descrições da
cura física. Assim, provavelmente, o significado do texto deva ser limitado à
cura física;
b. De quem é a cura?A
resposta de Tiago a esta pergunta é clara: "o Senhor o levantará". Em nenhum lugar
o Novo Testamento sugere qualquer outra resposta. Os apóstolos, ao
"curarem" as pessoas, deixavam claro que faziam aquilo somente
através do poder e da autoridade do Senhor Jesus (At 4.7-12). Paulo falou do
"dom" de cura (1 Co 12.9, 28), mas este dom, como todos os outros,
era permitido e dirigido pelo Espírito que o deu. Entretanto, é interessante
que, enquanto Paulo fala de um dom de cura, Tiago refere-se apenas aos
presbíteros que oram pela cura. Não havia outras pessoas que possuíam o dom de
cura nas igrejas de Tiago? O poder de cura é limitado por Tiago a certos
detentores de cargos eclesiásticos? Estas perguntas são de difíceis respostas e
nos envolvem na questão maior acerca da relação entre ministérios
"carismáticos" e "organizados" no Novo Testamento. Contudo,
em breves palavras, parece que as primeiras igrejas diferiam no grau em que
certos dons eram manifestados. Na verdade, a igreja de Corinto parece ter sido
uma exceção no Novo Testamento, uma vez que apenas ali ficamos sabendo dos dons
"espetaculares" como "curas" e "milagres"
(contraste Rm 12.6-8 e Ef 4.11). A "organização" eclesiástica não
deve ser considerada como depreciadora dos dons ou omissa acerca deles, mas
como um meio útil de reconhecimento e manifestação dos dons para a edificação
da igreja. Os presbíteros eram aqueles líderes espirituais reconhecidos por sua
maturidade na fé. Portanto, é natural que eles, com sua rica e profunda
experiência, fossem chamados para orar pela cura. Eles, mais que as outras
pessoas, deviam ser capazes de discernir a vontade do Senhor e orar com a fé
que reconhece e recebe de Deus a dádiva da cura. Ao mesmo tempo, Tiago esclarece que a igreja, como um
todo, deve orar pela cura (v. 16a). Desta forma, embora não negue que
algumas pessoas na igreja possam ter o dom da cura, Tiago incentiva todos os
cristãos, e especialmente aqueles encarregados da supervisão pastoral, a serem
ativos na oração pela cura.
c. Em que condições
Deus cura? Talvez não exista maior desafio à fé do que aquele que surge quando
orações fervorosas e diligentes a favor de nossa cura e de outras pessoas não
são atendidas. Em tais situações surgem várias perguntas persistentes.
Qual pecado da pessoa doente
impediu a cura? Não há dúvida de que isto, algumas vezes, pode acontecer. Paulo
diz especificamente que alguns cristãos coríntios adoeceram e morreram, por
causa do abuso praticado na Ceia do Senhor (1 Co 11.30). Em tempos de
enfermidade, é apropriado examinarmos nossa vida espiritual, a fim de vermos se
algo não está errado; e, com amor pastoral, incentivar outras pessoas a fazerem
o mesmo. Tiago diz que a
confissão do pecado pode levar à cura (v. 16). Por outro lado, ele também esclarece que nem toda
doença é causada por pecado (veja o comentário ao versículo 15). A idéia de que precisa haver uma
correspondência direta entre pecado e doença é evidentemente rejeitada pelas
Escrituras (cf. Jó; Jo 9.2-3). Portanto, nem sempre, e talvez nem
geralmente, um pecado específico faz que as orações por cura deixem de ser
atendidas.
Será que a falta de fé
impediu a cura? Eu, ou aqueles que por mim oraram, não creram com suficiente
profundidade? Como já vimos, Tiago especifica claramente que é à "oração
da fé" que Deus responde. Então, ele parece deixar subentendido que a
falta de fé é um obstáculo à operação de cura realizada por Deus. Mas devemos
observar cuidadosamente o que isto quer dizer. A fé exercida na oração é a fé
no Deus que, de modo soberano, realiza sua vontade. Quando oramos, nossa fé deve necessariamente
incluir esta admissão, implícita ou explícita, dos soberanos propósitos da
providência divina. É possível que, às vezes, recebamos o discernimento
acerca da sua vontade em circunstâncias específicas e oremos com absoluta
confiança de que o plano de Deus é atender a nosso pedido. Mas é lógico que
casos assim são bem raros — mais raros do que nossos desejos emocionais e
subjetivos podem nos levar a pensar. Assim, a oração pela cura precisa geralmente
se qualificar por um reconhecimento de que a vontade de Deus naquele assunto é
suprema. E está bem claro
no Novo Testamento que Deus nem sempre irá curar o crente. A própria oração de Paulo em
favor de sua cura, feita três vezes, não foi respondida; Deus tinha um
propósito em permitir que o "espinho na carne", aquele
"mensageiro de Satanás", fosse mantido (2 Co 12.7-9). Desta
forma, o que estamos afirmando é que a fé com a qual oramos é sempre fé no Deus
cuja vontade é suprema e melhor; apenas algumas vezes esta fé inclui a certeza
de que um pedido em particular está dentro daquela vontade. É exatamente esta
qualificação que se requer para a compreensão da própria promessa de Jesus:
"Se me pedirdes alguma coisa em meu nome, eu a farei" (Jo 14.14). Pedir "em nome de
Jesus" não significa simplesmente proferir seu nome, mas levar em conta
sua vontade. Apenas aqueles pedidos feitos "segundo esta vontade" estão garantidos.
A oração pela cura, oferecida na confiança de que Deus irá responder à oração,
realmente traz a cura; mas esta fé, um dom de Deus, estará presente apenas
quando a cura for da vontade de Deus. Por mais dotados, insistentes ou justos
que sejamos, esta fé não pode ser "fabricada". Nesta vida, na maioria
das vezes, não teremos capacidade de saber se a vontade de Deus é de curar; nem
sempre seremos capazes de sentir se está presente aquela "fé" que
obtém o que pede. Portanto,
quando nossas orações sinceras e fervorosas em favor da cura não são
atendidas, o problema não está em nossa falta de fé; está faltando o contexto
no qual aquela fé poderia estar presente.
16b. O lembrete de
Tiago acerca do grande poder da oração, na última parte do versículo 16,
fornece a base para as exortações à oração, feitas nos versículos 13-16a. O
poder da oração não está limitado aos "super-santos"; o justo designa
apenas uma pessoa sinceramente comprometida com Deus e que, de coração, busca
fazer sua vontade. Aqui, Tiago aplica uma terceira palavra para
"oração" (ARC; deêsis), mas aparentemente ele a usa sem fazer
qualquer distinção de sentido em relação às outras duas palavras usadas neste
parágrafo (cf. proseuchomai nos vv. 13,14, 17-18; euchomai nos vv. 15-16a).
Para enfatizar a força da oração, Tiago acrescentou dois qualificadores ao
verbo "poder" (pode): a oração pode "em quantidade", muito
(poly), e "em sua operação", por sua eficácia (energoumeriê). A
última palavra, um particípio, pode ser passiva ou média. Se passiva, devemos
traduzir "a oração é muito poderosa quando energizada (por Deus ou pelo
Espírito)". Daí, seria introduzida uma qualificação específica sobre a
eficácia da oração do ponto de vista da vontade de Deus. Entretanto, é mais
provável que o particípio seja médio (como pressupõe a maioria das traduções
modernas), com o
significado "a oração é muito poderosa em sua operação, ou em seu
efeito".
17-18. Como exemplo de
um homem justo, cujas orações tiveram grande efeito, Tiago menciona Elias. O profeta, cujos feitos foram
tão espetaculares, e cuja "morte" foi tão extraordinária, era uma das
mais populares figuras entre os judeus. Ele era exaltado por seus
milagres poderosos e denúncias proféticas do pecado. Entretanto, acima de tudo,
ele era esperado como o ajudador em tempos de necessidade, cuja vinda iria
preparar o caminho para a era messiânica (Ml 4.5-6; Eclesiástico 48.1-10; Mc
9.12; Lc 1.17). Contudo, o que interessa a Tiago não são os dotes proféticos
especiais de Elias ou seu lugar único na história, mas o fato de que, embora sendo homem semelhante a
nós, sua oração teve grande eficácia. Tiago enfatiza o fervor da oração
de Elias, ao usar uma construção "cognata" de influência semítica:
literalmente "em oração, ele orou". Ele deseja que seus leitores reconheçam que este poder da
oração está à disposição de todos que, sinceramente, seguem o Senhor — não
apenas a algumas pessoas.
A situação descrita por
Tiago está registrada em 1 Rs 17-18.
A seca foi proclamada por Deus, através de Elias, como
um meio de punição contra Acabe e Israel, por sua idolatria. Apesar de o Antigo
Testamento não declarar que Elias orou para que ocorresse a seca, 1 Rs 18.42
retrata-o orando pelo fim
dela, e é legítima a inferência de que ele também orou pelo seu começo.
De forma semelhante, provavelmente devamos considerar os três anos e seis
meses, especificados por Tiago (cf. também Lc 4.25), como um número mais exato
dos "três anos" redondos de 1 Rs 18.1. Talvez "três anos e seis
meses" tenha sido sugerido por causa de suas associações simbólicas com um
período de julgamento (Dn 7.25; cf. Ap 11.12; 12.14). Mas, à vista do fato de
que o Antigo Testamento nunca faz uma menção específica da oração de Elias
pedindo a seca, por que Tiago teria escolhido isto como seu exemplo —
particularmente por haver outros exemplos de oração de Elias muito mais
conhecidos (o fogo que consumiu o sacrifício no Monte Carmelo) ou por serem
mais apropriados ao contexto de Tiago (a ressurreição do filho da viúva)? É
possível que Tiago pretenda que vejamos no solo morto que volta à vida uma
analogia da enfermidade do crente que tem sua saúde restaurada (Davids), que
veremos seu comentário na ajuda 2. Por outro lado, existem sinais de uma
tradição que associava a seca com a oração de Elias (Eclesiástico 48.2-3; 2
Esdras 7.109), e é provável que Tiago tenha feito esta escolha simplesmente por
se tratar de uma ilustração conhecida.
Bibliografia J. Moo