CARTA À IGREJA DE TIATIRA, 2.18-29
1. Destinatário (2.18a)
Cerca
de 65 quilômetros a sudeste de Pérgamo ficava Tiatira. Era uma cidade da Lídia,
perto da fronteira com a Mísia (veja mapa 1). Construída por Seleuco 1,
fundador da dinastia dos Selêucidas, ela foi povoada pelos veteranos das
campanhas de Alexandre, o Grande, na Asia. Em torno de 190 a.C., Tiatira foi
tomada pelos romanos. Embora tivesse um centro comercial próspero, era muito
inferior ao de Efeso, Esmirna, e Pérgamo. Charles observa: “A carta mais longa
foi dirigida à cidade menos importante das Sete Cidades”. Evidentemente, havia judeus ali, porque Atos
16.14 menciona “Lídia, vendedora de púrpura, da cidade de Tiatira, e que servia
a Deus”. Parece que na época ela era uma prosélita convertida ao judaísmo. A
igreja em Tiatira evidentemente era pequena. Fala-se que ela desapareceu no fim
do segundo século.
2. Autor (2.18b)
O
autor dessa carta se identifica como o Filho de Deus, uma frase encontrada
somente aqui no livro de Apocalipse. Jesus reivindicou esse título durante o
seu tempo aqui na terra (Mt 11.27; Lc 10.22) e aprovou Pedro por professá-lo
(Mt 16.16,17). Foi por causa dessa afirmação que Jesus foi condenado pelo
Sinédrio (Mt 26.63; Jo 19.7).
Cristo
é descrito como Aquele que tem os olhos como chama de fogo e os pés semelhantes
ao latão reluzente. Encontramos aqui um eco de 1.14,15. A adequação da
caracterização dupla é expressa da seguinte forma por Swete: “Essa menção dos
olhos que flamejam com indignação justa e os pés que podem pisotear os inimigos
da verdade prepara o leitor para o tom severo da declaração que se segue”.
Erdman se expressa de forma ainda mais sucinta: “Assim, ele é capaz de penetrar
nos segredos de todos os corações e ele tem poder para castigar e subjugar”. Esses
olhos flamejantes penetram e descobrem todo engano da hipocrisia. Nas
Escrituras, o latão freqüentemente é o símbolo do julgamento.
3. Aprovação (2.19)
As
palavras desse versículo na KJV obviamente estão incorretas, porque apresentam
uma lista começando e terminando com tuas obras — uma repetição sem
significado. Além disso, o melhor texto grego traz fé antes de serviço. A RSV
apresenta uma tradução correta: “Conheço as suas obras, o seu amor, a sua fé, o
seu serviço e a sua perseverança, e que suas últimas obras excedem as
primeiras”. A New English Bible traz: “Vocês agora estão fazendo ainda melhor
do que no princípio”.
Cristo
tinha elogiado a igreja de Efeso pelas suas obras. Mas a igreja de Tiatira
estava um passo à frente. Ela é cumprimentada pela sua caridade. A palavra
grega é ágape e sempre deveria ser traduzida por “amor”. Caridade representa os
cantas da Vulgata latina, a Bíblia oficial da igreja católica romana. Hoje,
caridade significa um espírito de tolerância ou dar aos necessitados. Ágape é
um termo muito mais rico do que isso. As pessoas do mundo também podem ser
filantrópicas ou tolerantes. Mas ágape é o amor divino implantado no coração
humano e que flui em um serviço abnegado e sacrificial aos outros.
A
palavra grega pistis pode significar ou fé ou “fidelidade” (NEB). Não se sabe exatamente
qual das duas palavras se tem em mente aqui. Talvez a melhor saída é permitir
os dois significados (cf. Phillips, “lealdade”). Serviço é diakonia. Beyer diz
que essa palavra significa “qualquer ‘realização de serviço’ feito com amor
genuíno”. Lenski define diakonia como “serviço voluntário para o benefício e a
ajuda daqueles que precisam dele e realizado liberalmente”. Paciência
(hypomone) significa mais do que o suportar passivo de privações ou provações.
Essa palavra significa, na verdade, uma constância ou persistência
(“perseverança”, NASB) positiva.
Devido
à prolongada censura que se segue, é surpreendente que uma aprovação tão
entusiástica é dada a essa igreja. Swete comenta: “E digno de observação que
nessas cartas às igrejas o elogio é apresentado com mais liberalidade, se é que
pode ser feito com justiça, quando segue a censura; diz-se mais acerca das boas
obras das igrejas de Efeso e Tiatira, do que das igrejas de Esmirna e
Filadélfia, em que não se encontra falta alguma”. Essa característica está de
acordo com a psicologia sadia, que aconselha a dizer tudo que é positivo antes
de se chamar a atenção das faltas da outra pessoa.
4. Censura (2.20-23)
A
primeira parte do versículo 20 deveria ser traduzida da seguinte forma: “No
entanto, contra você tenho isto: que você tolera a mulher Jezabel” (RSV, NASB).
A tolerância do mal era o pecado constante da igreja de Tiatira. Jezabel é
provavelmente um nome simbólico — “Essa mulher, Jezabel”. A referência é
obviamente à esposa de Acabe, que seduziu os israelitas a adorar Baal (1 Rs
16.31). Também são mencionados suas “prostituições” e “feitiçarias” (2 Rs
9.22). Uma vez que alguns manuscritos e versões antigas trazem “tua mulher
Jezabel” (i.e., “tua esposa Jezabel”), Grotius (Século dezessete) sugere que o
autor fala da esposa do bispo de Tiatira. Mas essa noção é hoje quase
universalmente rejeitada. Duesterdieck diz que se tem “uma mulher específica em
mente; não a esposa de um bispo, nem uma mulher que é, de fato, chamada
Jezabel, mas uma determinada mulher que diante da ambição de ser uma profetisa
tinha aprovado as doutrinas dos nicolaítas e por esse motivo foi escolhida a
nova Jezabel”. Isso provavelmente representa a opinião da maioria hoje.
Não
era incomum ter uma profetisa na Igreja Primitiva (cf. At 21.9). No Antigo
Testamento,
diversas mulheres recebem esse título (e.g., Miriã, Débora, Hulda). O único
lugar no Novo Testamento em que prophetis (fem.) ocorre é Lucas 2.36 (Ana).
A
falsa profetisa de Tiatira estava sendo tolerada para que ensine e engane os
meus servos, para que se prostituam e comam dos sacrifícios da idolatria. Essas
duas coisas são atribuídas aos seguidores de Balaão (e nicolaítas?) em Pérgamo
(v. 14; veja comentários).
Tiatira
era conhecida pelas suas inúmeras associações comerciais. Isso gerava um
problema especial. Charles escreve: “Agora, visto que a participação de alguma
dessas associações [...] não significava essencialmente nada além de participar
de uma refeição em comum, que era dedicada indubitavelmente a algum deus pagão,
mas que era exatamente por isso sem sentido para o cristão iluminado;
beneficiar-se desse tipo de participação era considerado em certos círculos
liberais algo bastante justificável.
Por
razões comerciais ou sociais, parecia quase imperativo pertencer a alguma
associação.
Mas,
acredita-se que essas reuniões comerciais freqüentemente acabavam em orgias e
bebedeiras. Por isso, a referência à prostituição. Essa profetisa estava
defendendo uma atitude moral e religiosamente liberal.
Evidentemente,
uma advertência peremptória foi dada a essa Jezabel, mas ela tinha se recusado
a se arrepender (v. 21), i.e., mudar sua opinião e caminhos. Portanto, o Senhor
deve lidar com ela severamente. Por causa da sua prostituição Ele a colocaria
numa cama (22). Essa expressão é somente uma de muitas, que mostram a tendência
de João, que, embora escrevesse em grego, pensava em formas hebraicas. (Cf.
nota de rodapé 12 na Introdução). Referente a essa frase, Charles escreve: “Se
a traduzirmos literalmente para o hebraico, descobriremos que temos aqui uma
expressão idiomática hebraica [...] ‘ficar preso à cama’, ‘ficar doente’ (Ex 2
1.18): conseqüentemente, ‘colocar numa cama’ significa ‘colocar num leito de
enfermidade”.
E
sobre os que adulteram com ela virá grande tribulação, deve provavelmente ser
entendido como um paralelismo hebraico. Adulteraram provavelmente significa
adultério espiritual. Mas a porta da misericórdia continua aberta — se não se
arrependerem das suas obras. Arrependimento genuíno sempre coloca o julgamento
de lado.
Recusa
contínua de se arrepender resulta em mais castigo severo: E ferirei de morte a
seus filhos (23). Provavelmente, seus filhos significa: “sua descendência
espiritual, como distintos daqueles que foram enganados por um tempo”. Ferirei
de morte é um hebraísmo típico. Ele significa “matar” (ARA, NVI).
Essa
seria uma advertência para todas as igrejas. Elas saberão que eu sou aquele que
sonda as mentes e os corações (cf. Jr 11.20; 17.10). Mentes (palavra grega
somente encontrada aqui no NT) literalmente significa “os rins”; isto é, “os
movimentos da vontade e afeições”. Corações na psicologia hebraica referia-se
especialmente aos pensamentos. O olhar do Onisciente penetra até o mais
profundo do intelecto, emoções e vontade do homem. O julgamento divino sempre é
justo. Cada um receberá segundo as suas obras (cf. Rm 2.6).
5. Exortação (2.24,25)
Há
uma palavra de conforto aos restantes que estão em Tiatira (24) — talvez a maior
parte dos membros — e que não aceitaram a doutrina (ensinamento) de Jezabel, e
não conheceram [...] as profundezas de Satanás. Para os gnósticos do segundo
século, a expressão “as coisas profundas” era uma frase favorita. Eles
reivindicavam um conhecimento esotérico que era desconhecido pelas pessoas não
iniciadas.
Duas
interpretações têm sido apresentadas acerca das profundezas de Satanás. Uma é
que os nicolaítas escarneciam do restante dos cristãos como aqueles que não
conheciam as coisas profundas de Deus; mas essas, na verdade, se referiam às
coisas profundas de Satanás. A outra diz que os seguidores de Jezabel, na
realidade, se vangloriavam em conhecer as profundezas de Satanás. “Esses falsos
mestres entendiam que o homem espiritual deveria conhecer as coisas profundas de
Satanás e que ele deveria tomar parte da vida pagã da comunidade. Duas das
características mais salientes dessa vida pagã eram suas festas sacrificais e
suas práticas imorais.”
Muitos
gnósticos de épocas posteriores afirmavam que, visto que toda a matéria é má e
somente o espírito é bom, não importa o que alguém faça com o seu corpo; sua
alma continua pura. As duas interpretações acima podem ser aplicadas às
doutrinas de mestres imorais de Tiatira.
Como
dizem significa “como as chamam”. Paulo falou dos mistérios profundos da
verdade divina (cf. Rm 11.33; Ef 3.18). Esses falsos mestres estavam
distorcendo essa idéia. Para aqueles que permaneceram leais à fé, Cristo
declarou: outra carga vos não porei. Provavelmente, isso esteja relacionado com
o versículo 25: Mas o que tendes, retende-o até que eu venha. Charles
interpreta isso assim: “Definitivamente, dominem (kratesate) com firmeza as
tarefas incumbidas a vocês, e afastem-se completamente das festas sacrificais
dos pagãos e das perversidades morais que praticam”. Ele acha que outra carga
se refere aos decretos apostólicos de Atos 15.28. Mas muitos comentaristas
questionam isso. Parece duvidoso que esses decretos ainda seriam mencionados
numa época bem posterior.
6.
Recompensa (2.26-28)
A
frase recorrente ao que vencer (26) é acrescentado aqui: e guardar até ao fim
as minhas obras. Swete observa: “Em Tiatira, a batalha precisava ser vencida
pela adesão resoluta às ‘obras de Cristo’, i.e., à pureza da vida cristã, em
oposição às ‘obras de Jezabel’“‘ A recompensa prometida é: eu lhe darei poder
(exousia, autoridade) sobre as nações. O Cristo glorificado compartilhará a sua
autoridade com seus seguidores fiéis. A linguagem dessa cláusula e o que segue
no versículo seguinte são tirados de Salmos 2.8-9, que era interpretado como um
salmo messiânico pelos judeus do século 1 a.C., de acordo com Salmos de Salomão
(uma obra apócrifa).
A
palavra regerá (27) literalmente significa “pastorear”. Assim, a vara de ferro
se refere ao cajado do pastor, com a ponta de ferro para torná-la uma arma
adequada contra os inimigos ou animais selvagens. Os ímpios são comparados com
vasos de oleiro que serão quebrados. Embora essas palavras possam ter alguma
aplicação à influência da Igreja no mundo atual, é óbvio que o seu cumprimento
final aguarda o retorno de Cristo. Como também recebi de meu Pai é um eco de
Salmos 2.7 e Atos 2.33.
Na
declaração dar-lhe-ei a estrela da manhã (28), há uma expectativa de 22.16:
“Eu
sou a Raiz e a Geração de Davi, a resplandecente Estrela da manhã”. A maior
recompensa que qualquer cristão vitorioso pode receber é o próprio Cristo. Sua
presença será o céu em sua glória mais elevada.
7. Convite (2.29)
Nas
três últimas cartas, esse convite precedeu a promessa ao vencedor. Nessa e nas três
cartas seguintes ela segue a promessa. Alguém sugeriu (Pulpit Commentary) que
essa carta revela “A Ira do Cordeiro”: 1) Sua realidade (v. 18); 2) Sua
severidade (vv. 22-23); 3) Sua omissão (v. 21); 4) Sua justiça (v. 20); 5) Sua
discriminação (vv. 24-25).
Elaboração
pelo:- Evangelista Isaias Silva de Jesus
Igreja
Evangélica Assembléia de Deus Ministério Belém Em Dourados – MS
Comentário
Bíblico Beacon
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