sexta-feira, 27 de abril de 2012

CARTA À IGREJA DE TIATIRA, 2.18-29

CARTA À IGREJA DE TIATIRA, 2.18-29

1. Destinatário (2.18a)

Cerca de 65 quilômetros a sudeste de Pérgamo ficava Tiatira. Era uma cidade da Lídia, perto da fronteira com a Mísia (veja mapa 1). Construída por Seleuco 1, fundador da dinastia dos Selêucidas, ela foi povoada pelos veteranos das campanhas de Alexandre, o Grande, na Asia. Em torno de 190 a.C., Tiatira foi tomada pelos romanos. Embora tivesse um centro comercial próspero, era muito inferior ao de Efeso, Esmirna, e Pérgamo. Charles observa: “A carta mais longa foi dirigida à cidade menos importante das Sete Cidades”.  Evidentemente, havia judeus ali, porque Atos 16.14 menciona “Lídia, vendedora de púrpura, da cidade de Tiatira, e que servia a Deus”. Parece que na época ela era uma prosélita convertida ao judaísmo. A igreja em Tiatira evidentemente era pequena. Fala-se que ela desapareceu no fim do segundo século.

2. Autor (2.18b)

O autor dessa carta se identifica como o Filho de Deus, uma frase encontrada somente aqui no livro de Apocalipse. Jesus reivindicou esse título durante o seu tempo aqui na terra (Mt 11.27; Lc 10.22) e aprovou Pedro por professá-lo (Mt 16.16,17). Foi por causa dessa afirmação que Jesus foi condenado pelo Sinédrio (Mt 26.63; Jo 19.7).

Cristo é descrito como Aquele que tem os olhos como chama de fogo e os pés semelhantes ao latão reluzente. Encontramos aqui um eco de 1.14,15. A adequação da caracterização dupla é expressa da seguinte forma por Swete: “Essa menção dos olhos que flamejam com indignação justa e os pés que podem pisotear os inimigos da verdade prepara o leitor para o tom severo da declaração que se segue”. Erdman se expressa de forma ainda mais sucinta: “Assim, ele é capaz de penetrar nos segredos de todos os corações e ele tem poder para castigar e subjugar”. Esses olhos flamejantes penetram e descobrem todo engano da hipocrisia. Nas Escrituras, o latão freqüentemente é o símbolo do julgamento.

3. Aprovação (2.19)

As palavras desse versículo na KJV obviamente estão incorretas, porque apresentam uma lista começando e terminando com tuas obras — uma repetição sem significado. Além disso, o melhor texto grego traz fé antes de serviço. A RSV apresenta uma tradução correta: “Conheço as suas obras, o seu amor, a sua fé, o seu serviço e a sua perseverança, e que suas últimas obras excedem as primeiras”. A New English Bible traz: “Vocês agora estão fazendo ainda melhor do que no princípio”.

Cristo tinha elogiado a igreja de Efeso pelas suas obras. Mas a igreja de Tiatira estava um passo à frente. Ela é cumprimentada pela sua caridade. A palavra grega é ágape e sempre deveria ser traduzida por “amor”. Caridade representa os cantas da Vulgata latina, a Bíblia oficial da igreja católica romana. Hoje, caridade significa um espírito de tolerância ou dar aos necessitados. Ágape é um termo muito mais rico do que isso. As pessoas do mundo também podem ser filantrópicas ou tolerantes. Mas ágape é o amor divino implantado no coração humano e que flui em um serviço abnegado e sacrificial aos outros.

A palavra grega pistis pode significar ou fé ou “fidelidade” (NEB). Não se sabe exatamente qual das duas palavras se tem em mente aqui. Talvez a melhor saída é permitir os dois significados (cf. Phillips, “lealdade”). Serviço é diakonia. Beyer diz que essa palavra significa “qualquer ‘realização de serviço’ feito com amor genuíno”. Lenski define diakonia como “serviço voluntário para o benefício e a ajuda daqueles que precisam dele e realizado liberalmente”. Paciência (hypomone) significa mais do que o suportar passivo de privações ou provações. Essa palavra significa, na verdade, uma constância ou persistência (“perseverança”, NASB) positiva.

Devido à prolongada censura que se segue, é surpreendente que uma aprovação tão entusiástica é dada a essa igreja. Swete comenta: “E digno de observação que nessas cartas às igrejas o elogio é apresentado com mais liberalidade, se é que pode ser feito com justiça, quando segue a censura; diz-se mais acerca das boas obras das igrejas de Efeso e Tiatira, do que das igrejas de Esmirna e Filadélfia, em que não se encontra falta alguma”. Essa característica está de acordo com a psicologia sadia, que aconselha a dizer tudo que é positivo antes de se chamar a atenção das faltas da outra pessoa.

4. Censura (2.20-23)

A primeira parte do versículo 20 deveria ser traduzida da seguinte forma: “No entanto, contra você tenho isto: que você tolera a mulher Jezabel” (RSV, NASB). A tolerância do mal era o pecado constante da igreja de Tiatira. Jezabel é provavelmente um nome simbólico — “Essa mulher, Jezabel”. A referência é obviamente à esposa de Acabe, que seduziu os israelitas a adorar Baal (1 Rs 16.31). Também são mencionados suas “prostituições” e “feitiçarias” (2 Rs 9.22). Uma vez que alguns manuscritos e versões antigas trazem “tua mulher Jezabel” (i.e., “tua esposa Jezabel”), Grotius (Século dezessete) sugere que o autor fala da esposa do bispo de Tiatira. Mas essa noção é hoje quase universalmente rejeitada. Duesterdieck diz que se tem “uma mulher específica em mente; não a esposa de um bispo, nem uma mulher que é, de fato, chamada Jezabel, mas uma determinada mulher que diante da ambição de ser uma profetisa tinha aprovado as doutrinas dos nicolaítas e por esse motivo foi escolhida a nova Jezabel”. Isso provavelmente representa a opinião da maioria hoje.

Não era incomum ter uma profetisa na Igreja Primitiva (cf. At 21.9). No Antigo
Testamento, diversas mulheres recebem esse título (e.g., Miriã, Débora, Hulda). O único lugar no Novo Testamento em que prophetis (fem.) ocorre é Lucas 2.36 (Ana).
A falsa profetisa de Tiatira estava sendo tolerada para que ensine e engane os meus servos, para que se prostituam e comam dos sacrifícios da idolatria. Essas duas coisas são atribuídas aos seguidores de Balaão (e nicolaítas?) em Pérgamo (v. 14; veja comentários).

Tiatira era conhecida pelas suas inúmeras associações comerciais. Isso gerava um problema especial. Charles escreve: “Agora, visto que a participação de alguma dessas associações [...] não significava essencialmente nada além de participar de uma refeição em comum, que era dedicada indubitavelmente a algum deus pagão, mas que era exatamente por isso sem sentido para o cristão iluminado; beneficiar-se desse tipo de participação era considerado em certos círculos liberais algo bastante justificável.
Por razões comerciais ou sociais, parecia quase imperativo pertencer a alguma associação.
Mas, acredita-se que essas reuniões comerciais freqüentemente acabavam em orgias e bebedeiras. Por isso, a referência à prostituição. Essa profetisa estava defendendo uma atitude moral e religiosamente liberal.

Evidentemente, uma advertência peremptória foi dada a essa Jezabel, mas ela tinha se recusado a se arrepender (v. 21), i.e., mudar sua opinião e caminhos. Portanto, o Senhor deve lidar com ela severamente. Por causa da sua prostituição Ele a colocaria numa cama (22). Essa expressão é somente uma de muitas, que mostram a tendência de João, que, embora escrevesse em grego, pensava em formas hebraicas. (Cf. nota de rodapé 12 na Introdução). Referente a essa frase, Charles escreve: “Se a traduzirmos literalmente para o hebraico, descobriremos que temos aqui uma expressão idiomática hebraica [...] ‘ficar preso à cama’, ‘ficar doente’ (Ex 2 1.18): conseqüentemente, ‘colocar numa cama’ significa ‘colocar num leito de enfermidade”.

E sobre os que adulteram com ela virá grande tribulação, deve provavelmente ser entendido como um paralelismo hebraico. Adulteraram provavelmente significa adultério espiritual. Mas a porta da misericórdia continua aberta — se não se arrependerem das suas obras. Arrependimento genuíno sempre coloca o julgamento de lado.

Recusa contínua de se arrepender resulta em mais castigo severo: E ferirei de morte a seus filhos (23). Provavelmente, seus filhos significa: “sua descendência espiritual, como distintos daqueles que foram enganados por um tempo”. Ferirei de morte é um hebraísmo típico. Ele significa “matar” (ARA, NVI).

Essa seria uma advertência para todas as igrejas. Elas saberão que eu sou aquele que sonda as mentes e os corações (cf. Jr 11.20; 17.10). Mentes (palavra grega somente encontrada aqui no NT) literalmente significa “os rins”; isto é, “os movimentos da vontade e afeições”. Corações na psicologia hebraica referia-se especialmente aos pensamentos. O olhar do Onisciente penetra até o mais profundo do intelecto, emoções e vontade do homem. O julgamento divino sempre é justo. Cada um receberá segundo as suas obras (cf. Rm 2.6).

5. Exortação (2.24,25)

Há uma palavra de conforto aos restantes que estão em Tiatira (24) — talvez a maior parte dos membros — e que não aceitaram a doutrina (ensinamento) de Jezabel, e não conheceram [...] as profundezas de Satanás. Para os gnósticos do segundo século, a expressão “as coisas profundas” era uma frase favorita. Eles reivindicavam um conhecimento esotérico que era desconhecido pelas pessoas não iniciadas.

Duas interpretações têm sido apresentadas acerca das profundezas de Satanás. Uma é que os nicolaítas escarneciam do restante dos cristãos como aqueles que não conheciam as coisas profundas de Deus; mas essas, na verdade, se referiam às coisas profundas de Satanás. A outra diz que os seguidores de Jezabel, na realidade, se vangloriavam em conhecer as profundezas de Satanás. “Esses falsos mestres entendiam que o homem espiritual deveria conhecer as coisas profundas de Satanás e que ele deveria tomar parte da vida pagã da comunidade. Duas das características mais salientes dessa vida pagã eram suas festas sacrificais e suas práticas imorais.”
Muitos gnósticos de épocas posteriores afirmavam que, visto que toda a matéria é má e somente o espírito é bom, não importa o que alguém faça com o seu corpo; sua alma continua pura. As duas interpretações acima podem ser aplicadas às doutrinas de mestres imorais de Tiatira.

Como dizem significa “como as chamam”. Paulo falou dos mistérios profundos da verdade divina (cf. Rm 11.33; Ef 3.18). Esses falsos mestres estavam distorcendo essa idéia. Para aqueles que permaneceram leais à fé, Cristo declarou: outra carga vos não porei. Provavelmente, isso esteja relacionado com o versículo 25: Mas o que tendes, retende-o até que eu venha. Charles interpreta isso assim: “Definitivamente, dominem (kratesate) com firmeza as tarefas incumbidas a vocês, e afastem-se completamente das festas sacrificais dos pagãos e das perversidades morais que praticam”. Ele acha que outra carga se refere aos decretos apostólicos de Atos 15.28. Mas muitos comentaristas questionam isso. Parece duvidoso que esses decretos ainda seriam mencionados numa época bem posterior.

6. Recompensa (2.26-28)
A frase recorrente ao que vencer (26) é acrescentado aqui: e guardar até ao fim as minhas obras. Swete observa: “Em Tiatira, a batalha precisava ser vencida pela adesão resoluta às ‘obras de Cristo’, i.e., à pureza da vida cristã, em oposição às ‘obras de Jezabel’“‘ A recompensa prometida é: eu lhe darei poder (exousia, autoridade) sobre as nações. O Cristo glorificado compartilhará a sua autoridade com seus seguidores fiéis. A linguagem dessa cláusula e o que segue no versículo seguinte são tirados de Salmos 2.8-9, que era interpretado como um salmo messiânico pelos judeus do século 1 a.C., de acordo com Salmos de Salomão (uma obra apócrifa).

A palavra regerá (27) literalmente significa “pastorear”. Assim, a vara de ferro se refere ao cajado do pastor, com a ponta de ferro para torná-la uma arma adequada contra os inimigos ou animais selvagens. Os ímpios são comparados com vasos de oleiro que serão quebrados. Embora essas palavras possam ter alguma aplicação à influência da Igreja no mundo atual, é óbvio que o seu cumprimento final aguarda o retorno de Cristo. Como também recebi de meu Pai é um eco de Salmos 2.7 e Atos 2.33.

Na declaração dar-lhe-ei a estrela da manhã (28), há uma expectativa de 22.16:
“Eu sou a Raiz e a Geração de Davi, a resplandecente Estrela da manhã”. A maior recompensa que qualquer cristão vitorioso pode receber é o próprio Cristo. Sua presença será o céu em sua glória mais elevada.

7. Convite (2.29)

Nas três últimas cartas, esse convite precedeu a promessa ao vencedor. Nessa e nas três cartas seguintes ela segue a promessa. Alguém sugeriu (Pulpit Commentary) que essa carta revela “A Ira do Cordeiro”: 1) Sua realidade (v. 18); 2) Sua severidade (vv. 22-23); 3) Sua omissão (v. 21); 4) Sua justiça (v. 20); 5) Sua discriminação (vv. 24-25).

Elaboração pelo:- Evangelista Isaias Silva de Jesus
Igreja Evangélica Assembléia de Deus Ministério Belém Em Dourados – MS
Comentário Bíblico Beacon

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