domingo, 1 de abril de 2012

O FILHO DO HOMEM, 1.9-20

O FILHO DO HOMEM, 1.9-20

O Cenário da Visão (1.9-11)

Antes que João pudesse receber uma apresentação prévia do que ocorreria no futuro, ele precisa ver o próprio Cristo. O cenário da visão era o apóstolo na ilha de Patmos em espírito, no dia do Senhor (10). O assunto da visão era o Filho do Homem, parado no meio da sua Igreja.

O autor apresenta-se como Eu, João (9). A. R. Fausset chama nossa atenção para os paralelos em Daniel 7.28; 9.2; 10.2 e comenta: “[Essa é] uma das muitas semelhanças entre os videntes apocalípticos do Antigo e do Novo Testamento, Nenhum outro autor das Escrituras usa essa frase”.

João se descreve como vosso irmão, ou companheiro cristão, e companheiro na aflição, e no Reino, e na paciência de Jesus Cristo. Isso é mais corretamente traduzido da seguinte forma: “companheiro participante [synkoinonos] na tribulação e reino e perseverança que estão em Jesus” (NASB). A palavra paciência é um termo passivo demais para o grego hypomone, que significa “persistência e constância”.

Acerca da frase na aflição, Bengel faz a seguinte observação convincente: “Esse livro tem um grande apreço pelos fiéis na aflição”. O livro de Apocalipse foi escrito em uma época de grande tribulação para os cristãos, e ele se torna muito significativo em  tempos como esses. João estava na ilha de Patmos. Essa era uma pequena ilha com cerca de 16 quilômetros de comprimento de norte a sul e não mais do que 10 quilômetros de largura situada a cerca de 60 quilômetros a sudoeste de Mileto. Ela é constituída de montes vulcânicos rochosos.

A apóstolo estava lá por causa da palavra de Deus e pelo testemunho de Jesus Cristo. Isso não significa que ele tinha ido à ilha para pregar o evangelho. Uma paráfrase correta seria: “porque eu havia pregado a palavra de Deus e dei meu testemunho de Jesus” (NEB). As pequenas ilhas do mar Egeu eram usadas pelos romanos como lugares de reclusão, para os quais eram banidos os prisioneiros políticos. Uma comparação entre 6.9 e 10.4 mostra que no livro de Apocalipse palavra de Deus e testemunho são usados em conexão com a perseguição dos cristãos. Falando da opressão por Domiciano (95 d.C.), Eusébio escreve: “Nessa perseguição, de acordo com a tradição, o apóstolo e evangelista João, que ainda estava vivo, em conseqüência do seu testemunho da palavra divina, foi condenado a morar na ilha de Patmos”.

Ele também diz: “Mas, depois que Domiciano tinha reinado quinze anos, e Nerva chegou ao governo, o senado romano decretou que [...J aqueles que tinham sido expulsos injustamente deveriam retornar aos seus lares e ter seus bens restaurados [...] Foi então que o apóstolo João retornou do exílio e voltou a morar em Efeso, de acordo com uma tradição antiga da igreja”. 

Parece que tempos de tribulação freqüentemente preparam o terreno para a revelação de Deus ao homem. Plummer observa: “Foi no exílio que Jacó viu Deus em Betel; foi no exílio que Moisés viu Deus na sarça ardente; foi no exílio que Elias ouviu ‘uma voz mansa e delicada’; foi no exílio que Ezequiel viu a glória do Senhor junto ao rio Quebar; foi no exílio que Daniel viu o “ancião de dias”.

João declara que quando recebeu a visão, estava em espírito (10). O que isso significa? Os tradutores têm interpretado essa frase de diversas formas: “em transe” (NT 2Oth Century), “inspirado pelo Espírito” (Weymouth), “arrebatado no Espírito” (Moffatt), “possuído pelo Espírito” (Berk.), “no poder do Espírito” (C. B. Williams), “alcançado pelo Espírito” (NEB). Os comentaristas diferem muito na tradução. Lange explica a frase como significando o seguinte: “transportado para fora da consciência ordinária de cada dia e colocado na condição de êxtase profético”. Simcox traz: “Foi levado a um estado de arrebatamento espiritual”. Charles diz que egenomen en pneumati (lit.: “tornei-me no espírito”) “não significa nada mais do que o vidente cair em transe”.

Lenski escreve: “A frase significa ‘em espírito’, e não deveríamos escrevê-la com letra maiúscula como que se referindo ao Espírito Santo. Esse é o pneuma de João”. Ele acredita tratar-se de um êxtase milagroso, “um estado causado diretamente por Deus”. Nós preferimos a interpretação de Swete que entende que toda a frase “denota a exaltação de um profeta debaixo da inspiração” (do Espírito).

Essa experiência imponente veio a João no dia do Senhor. Alguns entendem que isso significa “o dia do Senhor”, uma frase profética comum no Antigo e Novo Testamento. Eles acreditam que o vidente foi transportado em espírito para o tempo da Segunda Vinda.

Mas o grego aqui descarta essa interpretação. Do Senhor é um adjetivo, não a expressão comum do genitivo “do Senhor”. Essa expressão ocorre somente mais uma vez no Novo Testamento (1 Co 11.20 — “a Ceia do Senhor”). Ela significa “pertencer ao Senhor” ou “consagrado ao Senhor”.

O adjetivo é encontrado diversas vezes nas inscrições e nos papiros do Egito e Asia Menor, em que significa “imperial”.O exemplo mais antigo conhecido do uso dessa palavra está em uma inscrição de seis de julho de 68 d.C. Aqui são encontradas as ex- pressões “as finanças imperiais” e “tesouro imperial”. Deissmann também observa que desde 30 a.C. até o tempo de Trajano (98-117 d.C.) um certo dia de cada mês era observado como hemera Sebaste, em memória do nascimento de Augusto, e sugere que “o título distinto ‘dia do Senhor’ [kyriake hemera] pode ter estado conectado com sentimentos conscientes de protesto contra o culto ao imperador, ou seja, o ‘dia de Augusto”. Pode ser que os cristãos tenham adotado o nome dia do Senhor em comemoração à ressurreição de Jesus no primeiro dia da semana. No grego moderno, o domingo é chamado de kyriake. Dessa passagem no Apocalipse, Charles diz: “Aqui ‘dia do Senhor’ tornou-se uma designação técnica do domingo”.

Não é difícil reconstruir o cenário. No exílio em Patmos, João foi impedido de se reunir com os santos no domingo. Olhando para o mar aberto, ele indubitavelmente pensava nos cristãos em Efeso reunidos para adorar. Ele bem pode ter estado meditando na ressurreição. Moffatt sugere: “Com a sua mente absorvida no pensamento do Jesus exaltado e abastecida com conceitos de Daniel e Ezequiel, o profeta teve o seguinte êxtase no qual os pensamentos de Jesus e da igreja, já presentes na sua mente, são unidos em uma visão”.

T. F. Torrance une as afirmações dos versículos 9 e 10 — Eu, João [...] estava na ilha chamada Patmos e fui arrebatado em espírito, no dia do Senhor. Ele então faz esta observação:
“Nessas duas sentenças autobiográficas vemos logo de início a situação dupla da qual esse livro nasceu. Por um lado, há o destino duro e cruel do tempo, mas, por outro, há o Espírito do Deus Todo-poderoso”.

Assim, preparado no coração e na mente para a revelação, João ouviu atrás de si uma grande voz (cf. Ez 3.12). O som veio tão alto e claro como o soar de uma trombeta.
Que dizia (11) equivale a aspas. Aquele que falava era evidentemente Jesus (cf. vv. 12-13). As palavras “Eu sou o Alfa e o Omega, o Princípio e o Fim, e” não estão nos manuscritos mais antigos. O mesmo é verdade para que estão na Asia (cf. v. 4). João recebe a ordem de escrever em um livro o que vê. A palavra grega é biblion, origem da nossa palavra “Bíblia”. Ela se refere ao rolo de papiro, para ser distinguido de pergaminhos mais caros que eram feitos de peles de animais (cf. 2 Tm 4.13). O rolo de Apocalipse teria cerca de cinco metros de comprimento.

O rolo escrito deveria ser enviado para as sete igrejas (cf. v. 4). Essas igrejas são agora designadas pelo nome. As distâncias entre essas cidades são calculadas por Charles:
“Esmirna ficava a cerca de 65 quilômetros ao norte de Efeso, Pérgamo a 65 quilômetros ao norte de Esmirna, Tiatira a 72 quilômetros a sudeste de Pérgamo, Sardes a 48 quilômetros ao sul de Tiatira, Filadélfia a 48 quilômetros a sudeste de Sardes e Laodicéia a 65 quilômetros a sudeste da Filadélfia”. Bowman escreve: “Uma olhada no mapa da província romana da Asia mostra as sete igrejas organizadas na forma de um castiçal de sete braços do Templo de Herodes — números 1 e 7, 2 e 6, 3 e 5 formando pares de lados opostos com o número 4 no topo”.

Sir William Ramsay, uma das maiores autoridades da história primitiva da Asia Menor, insiste de forma acertada que deve ter havido um motivo para a seleção dessas sete igrejas em particular. O primeiro motivo era o sistema de estradas. Ele nota que “todas as Sete Cidades ficam na grande estrada circular que unia a parte mais populosa, rica e influente da província, a região centro-ocidental”. Ele finalmente chega à seguinte
 conclusão: “A hipótese inevitavelmente sugere que os sete grupos de igrejas, em que a província havia sido dividida antes que o Apocalipse tinha sido composto, eram sete distritos postais, cada um tendo como centro ou ponto de origem uma das sete cidades”. Isso é apenas uma teoria, mas ela parece interessante.

O Tema da Visão (1.12-20)

João se virou “para identificar a voz de quem estava falando” (NEB) com ele. E virei-me (12) — melhor traduzido por “tendo me virado” — vi sete castiçais de ouro
— ou “candelabros” ou “lustres”. Isso é diferente do que o castiçal de sete braços com sete lâmpadas de Zacarias 4.2. No meio dos castiçais de ouro havia um semelhante ao Filho do Homem (13). Visto que o grego não tem o artigo definido antes de Filho, muitos tradutores modernos trazem literalmente: “um filho do homem”. Plummer concorda com essa tradução e comenta: “O Messias glorificado ainda apresenta essa forma humana, da maneira como o discípulo amado o havia conhecido antes da sua ascensão”. Swete observa: “O Cristo glorificado é humano, mas transfigurado”.96 Semelhantemente, Lange escreve que semelhante (homoios) “é também em parte indicativo da visão apostólica de que a personalidade humana de Cristo, em sua glorificação, é vestida com o esplendor de majestade divina”.

A forma mais satisfatória de tratar a frase um semelhante ao Filho do Homem parece aquela que Simcox apresenta. Ele diz: “A ausência do artigo aqui não prova que não se tenha em mente o nosso Senhor, mas que o título foi tirado diretamente do grego em Daniel 7.13, em que as duas palavras também estão sem o artigo [...] as palavras em si não significam mais do que ‘eu vi uma figura humana’, mas as suas associações deixariam claro a todos os leitores do livro de Daniel que foi um Ser sobre-humano em forma humana; e para um cristão dos dias de João, como para os do tempo atual, Quem esse Ser era.

Os sete castiçais (candelabros) são mais tarde identificados como simbolizando “as sete igrejas” (v. 20). Assim, aqui a figura é de Cristo parado no meio de sua Igreja.
Esse é um pensamento tremendamente confortante. Mas, também encontramos um desafio nesse quadro. Se as igrejas são lâmpadas, elas deveriam iluminar as trevas desse mundo. Moffatt escreve: “A função das igrejas é personificar e expressar a luz da presença divina sobre a terra [...] seu dever é manter a luz queimando e brilhando, se não a razão da sua existência desaparece (2.5)”.

Agora vem a descrição detalhada do Filho do Homem glorificado.

O primeiro item é: vestido até aos pés de uma veste comprida. Com a exceção de vestido [...] de (particípio passivo perfeito) toda a cláusula é uma palavra no grego, podere. Ela é, na verdade, um adjetivo, encontrado somente aqui e significando “alcançando até os pés”. A palavra é usada em Exodo (LXX) para vestimentas sacerdotais. Moffatt diz que esse termo, “uma veste que alcança até os pés, era um símbolo oriental expressando dignidade”.’

A próxima cláusula, e cingido pelo peito com um cinto de ouro, é mais bem traduzido por: “e com um cinturão de ouro ao redor do peito” (Weymouth). Esse era “mais um símbolo de uma posição elevada, geralmente reservada a sacerdotes judeus, embora os persas freqüentemente se dirigissem aos seus deuses como ‘cingidos com cinturão elevado’  Ao unir essas duas sentenças, temos uma figura de dignidade sacerdotal e real. Para nenhum outro essa combinação é tão apropriada quanto para o nosso Senhor.

O terceiro item é: sua cabeça e cabelos eram brancos como lã branca, como a neve (14). Swete observa: “Exposjtores antigos encontram no cabelo branco como neve um símbolo da preexistência eterna do Filho”. Plummer escreve: “Esse branco como neve é
parcialmente o brilho da glória celestial, parcialmente a majestade da cabeça branca”.

Mas vários comentaristas chamam a atenção ao fato de que cabelo branco é um sinal de
decadência quando associado com idade. Assim, Lenski conclui: “Achamos que essa passagem com o símbolo do cabelo que é branco como neve e lã tem a intenção de representar Jesus como sendo coroado com santidade”. Há um paralelo próximo em Daniel 7.9 (LXX).

O quarto ponto na descrição do Cristo glorificado é que os olhos eram como chama de fogo (phlox pyros). Essa é uma alusão evidente a Daniel 10.6 — “e os seus olhos, como tochas de fogo” — uma metáfora comum na literatura latina e grega. J. B. Smith sugere que esse aspecto simboliza “onisciência e escrutínio”.’ Swete acrescenta:
“O brilho penetrante [...] que reluzia com inteligência vivaz, e quando necessário surgia com ira justa, foi percebido por aqueles que estavam com o nosso Senhor nos dias da sua carne [...] e encontra sua aposição, como o vidente agora percebe, na vida após a ressurreição e a ascensão”.

O quinto item é: e os seus pés, semelhantes a latão reluzente, como se tivesse
sido refinado numa fornalha (15). Novamente encontramos um paralelo em Daniel
10.6 — “e os seus braços e os seus pés, como cor de bronze polido” (cf. Ez 1.4, 7, 27; 8.2).

A palavra grega para latão reluzente (“bronze polido”, ARA) é incerta quanto ao seu significado etimológico. Mas, o sentido parece esse apresentado nas nossas versões em português. O simbolismo sugerido por Swete é: “Pés de latão representam força e estabilidade”. Refinado também pode ser traduzido por “incandescente” ou “ardente”. Nas Escrituras, latão parece tipificar julgamento.

Um sexto aspecto é: e a sua voz, como a voz de muitas águas. Em Daniel 10.6 lemos: “e a voz das suas palavras, como a voz de uma multidão”. Mas os ouvidos de João estavam repletos com o bramido das ondas do mar Egeu batendo contra a ilha rochosa de Patmos. Assim, ele usa essa imagem para descrever a voz. Ao fazê-lo, no entanto, ele estava fazendo eco a Ezequiel 43.2 — “a sua voz era como a voz de muitas águas”.

O Filho do Homem tinha na sua destra sete estrelas (16). O significado disso é dado no versículo 20. E da sua boca saía uma aguda espada de dois fios. Essa era originariamente “uma espada grande, longa e pesada, quase da altura de um homem, que é manejada com as duas mãos, uma arma dos trácios”. Mas na Septuagínta ela é aparentemente usada de forma sinônima à palavra mais conhecida para uma espada comum. Lenski acrescenta: “Onde lemos ‘dois fios’ o grego traz ‘duas bocas’, os dois gumes mordendo, devorando como duas bocas. A palavra ‘aguda’ é acrescentada. Ela era afiada a tal ponto que pudesse cortar profundamente”.

A linguagem dessa sentença parece refletir Isaías 11.4: “e ferirá a terra com a vara de sua boca”; e Isaías 49.2: “E fez a minha boca como uma espada aguda”. Charles comenta: “A espada que procede da boca do Filho de Deus é simplesmente um símbolo da sua autoridade judicial”.”° Retratos literais disso na arte religiosa e diagramas proféticos mostram-se ridículos e beiram o sacrilégio. Eles deveriam nos advertir contra representações visuais de figuras simbólicas no Apocalipse. O último item da descrição é o seguinte: e o seu rosto era como o sol, quando na sua força resplandece. Esse é um eco óbvio da transfiguração (Mt 17.2).

Depois de observar os diversos empréstimos do livro de Daniel, Kiddle faz este comentário: “Embora uma parte do quadro de João não seja original, ele transmite uma concepção do Messias que é única, porque Cristo é dotado de um esplendor e autoridade que até então somente tinham sido atribuídos a Deus”.  Essa é uma das ênfases inequívocas do Novo Testamento.

O efeito da visão foi esmagador: caí a seus pés como morto (17). Daniel experimentou uma reação muito parecida em sua visão (Dn 10.8-9). Palavras semelhantes são usadas em Josué 5.14 e Ezequiel 1.28; 3.23; 43.3. Erdman comenta: “Cada visão da pureza, majestade e poder divino inspira admiração e reverência”.
No entanto, esse Cristo severo do julgamento também era o Cristo compassivo. Porque ele pôs sobre João a sua destra (cf. Dn 10.10; Mt 17.1) e disse: Não temas (cf. Dn 10.12). Eu sou o Primeiro e o Ultimo é usado para referir-se a Deus em Isaías 44.6. Mas aqui essa frase se refere claramente a Cristo, e ressalta a sua divindade, como é o caso em 2.8 e 22.13.

E o que vive (18) ou “e Aquele que vive” (kai ho zon) — um título divino, aplicado a Deus tanto no Antigo como no Novo Testamento. Essa frase deveria ser conectada com o que precede ou com o que segue, [e] fui morto (kai egenomen necros)? Charles entende que se refere à segunda opção. Ele une os dois itens em uma linha poética: “E Aquele que vive e estava morto”. Então diz: “Os comentaristas mais recentes conectam kai ho zon com as palavras precedentes. Mas em cada exemplo, quer em Isaías quer no Apocalipse, a frase ‘eu sou o Primeiro e o Ultimo’ é completa em si mesma, e a frase kai ho zon simplesmente enfraqueceria a plenitude da afirmação feita nessas palavras. Por outro lado, quando conectadas a kai egenomen necros, elas são cheias de significado no contraste entre a vida eterna que Ele possui e a condição da morte física à qual se submeteu por amor do homem”.

Aquele que estava morto agora pode dizer: eis aqui estou vivo para todo o sempre. Em outras palavras, Ele é o Eterno. A palavra Amém não é encontrada nos melhores manuscritos gregos e deveria ser omitida. Há mais uma afirmação: E tenho as chaves da morte e do inferno. Talvez fosse melhor transliterar hades, em vez de traduzir por inferno (cf. NVI — “E tenho as chaves da morte e do Hades”).

Uma vez que tem havido muita discussão acerca desse termo, seria proveitoso estudar um pouco melhor o seu significado. No pensamento grego, Hades era primeiramente o nome do deus do submundo. Mais tarde tornou-se sinônimo do submundo em si, como o lugar dos espíritos dos mortos. Na Septuaginta, Hades é a tradução da palavra hebraica Sheol, o reino dos mortos.

Josefo, o historiador judeu do primeiro século, revela o pensamento confuso do judaísmo nos dias de Jesus acerca desse assunto. Ele declara que os fariseus entendiam que as almas dos justos e dos ímpios ficavam no Hades.”4 Mas, embora sendo ele próprio um fariseu, escreve que a alma do obediente “obtém um lugar santíssimo no céu E...] enquanto a alma daquele que agiu perversamente é recebida no lugar mais sombrio no Hades”.

Poderia parecer que o termo Geena, nos ensinamentos de Jesus (cf. Mt 5.22), devesse ser identificado com o “lago de fogo” de Apocalipse 19.20; 20.10, 14-15. Mas a morte e o Hades são lançados no lago de fogo (20.14). Assim, obviamente o lugar do castigo eterno é Geena, não Hades. J. Jerernias escreve: “Em todo o NT, Hades serve somente como um propósito interino. O Hades recebe as almas após a morte e os entrega novamente na ressurreição (Ap 20. 13).1 16 Charles diz o seguinte acerca desse termo em Apocalipse: “De acordo com nosso autor, Hades é a habitação intermediária somente dos ímpios ou injustos”.

As chaves significam autoridade. Jesus possui plena autoridade sobre o domínio da morte e do Hades. R. H. Charles apresenta uma observação apropriada acerca do versículo 18:
“Esse versículo descreve o triplo conceito de Cristo em João: a vida eterna permanente que Ele tinha independentemente do mundo; sua humilhação a ponto de morrer fisicamente e sua ressurreição para uma vida não somente eterna em si mas para uma autoridade universal sobre a vida e a morte”.

Charles Simeon nota que nos versículos 17-18, Jesus faz uma afirmação tríplice de ser: 1) o Deus eterno; 2) o Salvador vivo; 3) o Soberano universal.

João já havia recebido a ordem de escrever em um rolo “o que vês” (v. 11). Agora a ordem é repetida e feita de forma mais explícita: Escreve as coisas que tens visto, e as que são, e as que depois destas hão de acontecer (19).

Erdman rejeita fortemente a “concepção popular” de que esse versículo nos fornece um esboço triplo do livro de Apocalipse.Mas nós preferimos seguir Charles quando escreve: “Essas palavras resumem, grosso modo, o conteúdo do livro. Ha eides [as coisas que tens visto] é a visão do Filho de Deus que tinha acabado de ser mostrada ao vidente; ha eisin [as que são] refere-se diretamente à condição atual da Igreja, mostrada nos capítulos 2 e 3, e indiretamente ao mundo em geral; he meilei ginesthai meta tauta [as que depois destas hão de acontecer] diz respeito às visões a partir do capítulo 4, que, com a exceção de algumas seções que se referem ao passado e ao presente, tratam do futuro”. Esse é o esboço adotado neste comentário.

O primeiro capítulo termina com uma explanação do mistério das sete estrelas [...] e dos sete castiçais. Acerca dessa expressão significativa Erdman escreve:”‘Mistério’ é no uso do Novo Testamento, verdade ou realidade divinamente revelada”. Swete diz que mistério é “o significado interno de uma visão simbólica”.

João é informado de que as sete estrelas representam os anjos das sete igrejas. Uma vez que a palavra grega angelos significa “mensageiro” e é claramente usada para mensageiros humanos em Lucas 7.24; 9.52 e Tiago 2.25, muitos acreditam que a referência aqui seja aos mensageiros que seriam enviados com as cartas às sete igrejas — talvez delegados que vieram daqueles lugares para visitar João — ou mais simplesmente, os “pastores” das igrejas. Essa idéia é contestada, visto que nas mais de 60 vezes que a palavra angelos é usada nesse livro dissociada da conexão com as igrejas, ela sempre se refere a seres sobre-humanos.

Swete conclui: “Há, portanto, uma forte conjectura de que os angeloi ton ecciesion são ‘anjos’ no sentido que a palavra tem em outras partes do livro”. Charles concorda plenamente. Swete também não concorda em identificá-los como “anjos guardiões” das igrejas. Ele finalmente chega a uma conclusão: “Conseqüentemente, a única interpretação que sobra é a que entende que esses anjos são duplicatas ou contrapartes celestiais das sete Igrejas, que, assim, vêm a ser identificadas com as próprias Igrejas”. Provavelmente, mais aceitável é o ponto de vista de Erdman de que “anjo” é “o espírito predominante” na igreja, “uma personificação do caráter, temperamento e conduta da igreja”.

Parece que um ponto de vista melhor formulado é o de Alfred Plummer. Ele escreve:
“A identificação do anjo de cada igreja com a própria Igreja é mostrada de uma maneira marcante pelo fato de, embora cada epístola ser dirigida ao anjo, ainda assim, a estrofe recorrente seja: “ouça o que o Espírito diz às igrejas”, não “aos anjos das igrejas”.
O anjo e a Igreja são os mesmos sob diferentes aspectos: um no seu caráter espiritual personificado; o outro, na congregação dos crentes que coletivamente possuem esse caráter.

Mas nos perguntamos se essa interpretação deixa espaço adequado para a distinção
entre as estrelas e os castiçais. Este comentarista é relutante em desistir da visão popular de que os anjos são os pastores das igrejas um pensamento grandemente confortador: eles são guardados nas próprias mãos de Cristo.


Elaboração pelo:- Evangelista Isaias Silva de Jesus
Igreja Evangélica Assembléia de Deus Ministério Belém Em Dourados – MS


Fonte:- Comentário Bíblico Beacon


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